Vamos começar pelo básico da História que propositadamente fingem que não existiu. Antes da Revolução de 1959, Cuba era governada pela ditadura de Fulgencio Batista, um regime que massacrava opositores e entregava o país aos interesses estadunidenses. Havana era o quintal de jogatina e prostituição dos milionários dos Estados Unidos. A população rural vivia em miséria extrema. Em 1958, segundo a ONU, 44 por cento dos cubanos eram analfabetos funcionais e mais de 60 por cento viviam abaixo da linha da pobreza. A Revolução não derrubou um governo democrático; derrubou um regime corrupto, sanguinário e sustentado por Washington.
O que veio depois não é o que contam por aí. O governo revolucionário distribuiu terra entre a população, acabou com latifúndio, universalizou educação e saúde e erradicou o analfabetismo em dois anos. Em 1961, a campanha de alfabetização ganhou prêmio da UNESCO e fez o país saltar para uma das taxas de escolarização mais altas do planeta. Hoje Cuba tem um sistema de saúde citado pela OMS como referência, com mortalidade infantil menor do que a dos Estados Unidos. E sim, Cuba tem democracia. Não é a democracia de mercado que o capitalismo quer empurrar como a única aceitável. É uma democracia participativa, com mais de 47 mil delegados locais eleitos diretamente, comissões de bairro e participação popular massiva e voluntária.
Agora, vamos ao ponto: Cuba é pobre. Sim, é. Por quê? Pela mesma razão que qualquer país pequeno, insular, sem petróleo, sem grandes fontes de energia e sem recursos minerais estratégicos. A geografia não foi generosa com a ilha. Mas o principal, o que determina mesmo a pobreza cubana, não é o socialismo; é o bloqueio econômico imposto pelos Estados Unidos desde 1962, reforçado brutalmente pela Lei Helms-Burton de 1996. É um bloqueio que impede comércio, impede investimentos, impede bancos de operar com Cuba, impede empresas de vender tecnologia para a ilha e aplica multas bilionárias para qualquer país que tente furar esse cerco.
Segundo a CEPAL e a ONU, o bloqueio já causou prejuízos superiores a 154 bilhões de dólares. Só em 2022, foram 3,8 bilhões de dólares perdidos. Para um país pequeno, isso é devastador. E não é só isso. Os EUA mantêm uma ocupação irregular na ilha com Base Militar de Guantánamo como plataforma estratégica para pressionar a ilha e controlar todo o Mar do Caribe, além de ser usada como prisão onde as mais brutais denúncias de torturas vêm à público. O objetivo desse cerco é simples: sufocar economicamente Cuba para depois apontar o dedo e dizer que o socialismo não funciona. A ilha deveria ser um entreposto comercial natural do Caribe, mas o bloqueio estrangula exatamente essa potencialidade, ao mesmo tempo que dificulta severamente o turismo.
Então por que as pessoas saem de Cuba? Pela mesma razão que pessoas saem de países capitalistas como a Guatemala, Honduras, Haiti, Paraguai, Sudão, Filipinas e até mesmo do Brasil. Saem porque são países pobres. A diferença é que quem foge de Cuba recebe imediatamente asilo nos Estados Unidos por causa da política de incentivo migratório, criada justamente para usar o fluxo como propaganda contra a Revolução. Sim, mesmo com as políticas anti-imigração, um cubano é tido como exceção, pois alega ser foragido pelo regime, consegue facilmente residência e emprego pelas leis da Flórida. Pura manipulação geopolítica para inflar a elite “gusana” de cubanos em Miami, da qual o Secretário de Estado, Marco Rubio, faz parte. Ou seja, não é “fuga do socialismo”. É a indústria da fuga financiada pelo capitalismo.
Vamos agora falar da Venezuela. A história ali também começa muito antes do chavismo. Durante décadas, dois partidos praticamente iguais, AD e COPEI, governaram o país impondo um modelo neoliberal dos mais duros na América Latina. O Caracazo de 1989 foi um levante popular contra o arrocho imposto pelo FMI. Na década de 1990, o país estava um caos. A pobreza chegou a 70 por cento, a inflação passou de 100 por cento, e centenas de pessoas foram mortas pelas forças do Estado. O neoliberalismo ali produziu fome, literalmente.
Foi nesse contexto que surge Hugo Chávez, com o Movimento V República e o projeto da Revolução Bolivariana. Era um projeto que defendia soberania nacional, integração latino-americana, redistribuição de renda, democracia participativa e controle popular sobre o petróleo. Com sua vitória eleitoral, a revolução conquistou seus resultados. Durante seu governo, a pobreza caiu de 49 por cento para 27 por cento, a miséria despencou 72 por cento, universidades foram multiplicadas e milhões de pessoas tiveram acesso a saúde, educação, moradia e alimentação, o que inexistia anteriormente. Foram criados plebiscitos, referendos e mecanismos de participação popular na política. A democracia se ampliou, não diminuiu.
Em 2002, houve um golpe de Estado patrocinado pela elite econômica, com forte apoio estadunidense, que sequestrou Chávez e dissolveu as instituições. O povo saiu às ruas, os militares se rebelaram e o golpe foi derrotado em 48 horas. É o famoso episódio documentado em “A Revolução Não Será Televisionada”.
Agora, por que a Venezuela se empobreceu depois desses avanços? Primeiro, pela dependência histórica do petróleo. Quando o preço caiu, veio a crise. Mas o fator decisivo foi outro: a guerra econômica dos Estados Unidos. As sanções começadas em 2015 bloquearam contas da PDVSA, impediram venda de petróleo, congelaram ativos no exterior, proibiram empresas de comprarem petróleo venezuelano e asfixiaram a economia. Segundo o Center for Economic and Policy Research (CEPR), as sanções mataram mais de 40 mil pessoas entre 2017 e 2018 por falta de remédios e comida.
O cerco econômico à Venezuela não é diferente do de Cuba. Asfixia, demoniza e financia oposição. O NED, braço político dos Estados Unidos, admitiu investir 40 milhões de dólares por ano em grupos opositores na Venezuela. Ou seja, é uma oposição contratada para servir a interesses estrangeiros e assim ela se porta. Houve tentativas de golpe em 2002, 2003, 2014, 2017 e 2019. Todas com financiamento externo estadunidense e europeu. Em 2020, houve até tentativa de invasão marítima. E tudo isso para quê? Trump falou abertamente em 2019: “Os Estados Unidos deveriam ter tomado o petróleo da Venezuela”. Palavras dele.
O exemplo perfeito de como a extrema direita atua quando não consegue vencer nas urnas é Juan Guaidó. Ele nunca disputou eleição presidencial mas resolveu se autoproclamar presidente numa praça, com o aval dos Estados Unidos e da União Europeia. O discurso de “fraude eleitoral” que ele usou é o mesmo roteiro pronto que Trump usou ao perder para Biden e que Bolsonaro repetiu ao perder para Lula: acusações genéricas sem provas cujo o objetivo é deslegitimar a eleição para justificar ruptura institucional. Mas há uma ironia que os bolsonaristas jamais admitem: o sistema eleitoral venezuelano é um dos mais auditáveis do mundo, com voto eletrônico e IMPRESSO, dezenas de auditorias e observação internacional.
Mas nada se compara ao Nobel da Paz de 2025 ter sido entregue à oposicionista Maria Corina Machado, condenada pela justiça venezuelana por tentativas de desestabilização do país e conspiração internacional, acusações facilmente comprováveis porque ela admite publicamente. Premiar alguém nessa condição mostra como o Nobel virou instrumento geopolítico, perdendo qualquer sentido enquanto tenta empoderar figuras sem legitimidade real. Tudo segue a mesma cartilha: a extrema direita perde, grita fraude; quando não toma o poder pelo voto, tenta o caos.
Por isso, inventaram agora a conversa fiada de combate ao narcotráfico. A Colômbia, principal parceira dos EUA na região, produz 70 por cento da cocaína mundial, segundo a ONU. Se fosse sobre narcotráfico, a intervenção seria lá, e não na Venezuela. Mas a Colômbia não tem a maior reserva de petróleo do mundo como tem a Venezuela. Assim, o governo Trump explode barcos aleatoriamente, desrespeitando a soberania do país e o Direito Internacional. Aliás, quem garante que esses barcos são realmente de traficantes?
A verdade, portanto, é muito simples: tanto Cuba quanto Venezuela foram impedidas de prosperar pelas sanções, embargos e bloqueios econômicos impostos. A maior potência capitalista do planeta usou todo tipo de sabotagem, guerra econômica, financiamento de oposição e propaganda internacional para sufocar dois projetos que ousaram desafiar sua hegemonia. Não existe outro país no mundo com poder para fazer isso. Quem controla o sistema SWIFT, o dólar, a internet e o comércio global determina quem prospera e quem afunda. Assim, os Estados Unidos escolheram esses dois países para mostrar o que é capaz de fazer com quem não aceita ser capacho. Portanto, o discurso não é e nunca foi sobre democracia. Cuba foi sufocada por estar numa posição estratégica do Caribe. A Venezuela é alvo por ter as maiores reservas de petróleo do mundo.
A pobreza desses países, definitivamente não é falha do socialismo. Até mesmo porque desde o fim da Guerra Fria, Cuba está praticamente isolada sem o apoio do antigo bloco socialista. Da mesma forma, a Venezuela nunca chegou a se tornar um país socialista. Ser governado por um partido socialista não o transforma nesse regime se não mudar as estruturas do capitalismo que, na Venezuela, continuam intacto.
Portanto, a pobreza cubana e venezuelana é produto direto da máquina imperialista operando em modo de guerra permanente. Quando um país pobre tenta ser soberano, os Estados Unidos tratam isso como ameaça. Depois, quando a pobreza chega, a culpa é jogada no regime, não em quem impôs o estrangulamento. Por isso, o maior responsável pela situação desses dois país é exatamente o decadente império estadunidense que depois de suas derrotas no Oriente Médio e na Ásia volta a tentar transformar a América Latina em quintal.
LEGENDA DA FOTO: HUGO CHAVES DA VENEZUELA E FIDEL CASTRO DE CUBA
FOTO: Prensa Latina
FONTE: https://www.facebook.com/thomasdetoledo33