A indústria de guerra acumularia estoques inconsumíveis de mercadorias voltadas à destruição.
O perigo passa a rondar os grandes fundos de investimentos internacionais que atualmente garantem a reprodução ampliada de capital especulativo no processo de financeirização global, caso o presidente Donald Trump tranque o cofre do tesouro americano para não financiar guerra da OTAN na Ucrânia, na tarefa, que parece inglória, de tentar derrotar a Rússia.
Chega ao fim o papel da dívida pública americana como base da multiplicação dos investimentos especulativos, financiando indústrias armamentista, sustentáculo do Deep State, capaz de bancar a máquina bélica e espacial do império, reprodutor da acumulação capitalista acelerada.
Se Trump dá um breque nesse processo, vende ao mercado a expectativa de redução dos lucros especulativos que animam a financeirização.
Como a economia capitalista vive de expectativa, onde ocorreria, então, a reprodução do capital sobreacumulado, que não consegue se dar na produção de bens e serviços, já que haveria, se fosse deslocado para aumentar a oferta, frente a insuficiência de demanda, jogando a economia na deflação?
A indústria de guerra, que representa vanguarda tecnológica a se espalhar para os demais setores relacionados ao consumo popular, acumularia estoques inconsumíveis de mercadorias voltadas à destruição, sem que pudessem ser transformadas em produção de bens e serviços, devido ao perigo de elevar exponencialmente a oferta em relação à demanda, jogando os preços no chão.
Maldição marxista
Marx, em O Capital, diz que o capitalismo desenvolveria ao máximo as forças produtivas, entraria em crise e passaria a desenvolver as forças destrutivas, na guerra.
Ora, se Trump, no comando do Estado Industrial e Militar dos Estados Unidos, o mais poderoso da terra, esfria a oferta de produção bélica e espacial, a produção voltada à destruição, que cresceu para tirar da crise as forças produtivas, joga a economia de guerra, motor do capitalismo, na crise de realização de lucros.
Volta-se, justamente, à etapa anterior à crise liberal de 1929, colapso do laissez faire, geradora de deflação.
Para salvar o sistema capitalista em 1929, nasceu o keynesianismo, para usar o Estado forte capaz de puxar a demanda global, mediante emissão de moeda estatal inconversível inflacionária.
A dívida pública, no modelo estatal keynesiano, cresce, dialeticamente, no lugar da inflação, ocultando-a, para evitar deflação/hiperinflação.
Como disse Keynes, a opção pela deflação é um erro eterno.
A inflação aleija, mas a deflação mata.
O capitalismo pós 1929 é o oposto do capitalismo que vigorou sob equilíbrio orçamentário – déficit zero ou superávit fiscal neoliberal – como prega, hoje, como solução a Faria Lima.
Na prática, retorna-se ao padrão ouro, durante o império inglês, animado pela libra esterlina.
Voltar ao equilíbrio orçamentário, como diz o marxista Lauro Campos, em “A crise da ideologia keynesiana”, Editora Boitempo, 2ª edição, 2012, é retornar ao útero materno, só Freud explica.
Retorno ao passado como anti solução
Com o protecionismo trumpista, o presidente americano tenta voltar ao século 19, pré-Keynes, ao equilibrismo orçamentário, do qual os Estados Unidos fugiram para se tornar a grande potência global, usando emissão de dólar para gerar superávit financeiro com o qual bancava inflação e juros baixos para combater a inflação, realizando déficit comercial.
A manobra americana pós 1929 e, especialmente, pós segunda guerra, quando o dólar se torna referência internacional, tomando o lugar da libra esterlina inglesa, foi apostar no recado que Keynes deu a Roosevelt, em 1936:
“Penso ser incompatível com a democracia capitalista que o governo eleve seus gastos públicos, exceto em condições de guerra. Se os Estados Unidos se INSENSIBILIZAREM para a preparação das armas, aprenderão a conhecer sua força.”
Dessa forma, transformam-se em potência mundial, fugindo da receita neoliberal do equilibrismo orçamentário, para acumular déficit comercial e fiscal.
Com isso, valorizou o dólar, moeda soberana, de modo a viver de inflação e juros baixos, para financiar a dívida pública, com a qual se montou a indústria de guerra, conforme recomendação de Keynes.
Agora, com o protecionismo trumpista, os Estados Unidos, superendividados, sem fôlego para continuar bancar guerras e perdendo competitividade para a China, viram o disco: precisam desvalorizar o dólar para exportar e enfrentar os concorrentes, buscando superávit comercial, para fugir do perigo de déficit em contas correntes do balanço de pagamentos.
O sonho acabou
A farra do dólar valorizado para desvalorizar moedas dos concorrentes e importar barato, garantindo inflação baixa, acabou.
Se mantêm o jogo anterior do dólar forte, os americanos entram em colapso diante do yuan desvalorizado que inunda de mercadorias baratas os Estados Unidos e aceleram a desindustrialização.
Diante das novas circunstâncias, Trump põe em marcha guerra comercial, que, ao exigir dólar desvalorizado, impõe a suspensão dos gastos com guerras.
A Ucrânia está sendo transformada em laboratório para o novo experimento econômico imperialista – que na verdade é uma volta ao passado com riscos perigosos para o capitalismo americano – expresso em inversão do keynesianismo para o liberalismo nacionalista imperialista.
Não se tem certeza alguma de que dará certo, por conta da China, que já ultrapassou os Estados Unidos na corrida da produtividade capitalista.
Se a guerra, de solução passa a ser problema, para a reprodução do capital sobreacumulado, nos Estados Unidos, o perigo é a sobrevivência do subproduto econômico do modelo keynesiano que entra em crise, ou seja, a financeirização especulativa.
FOTO: White House Rapid Response
FONTE: https://www.brasil247.com/blog/a-financeirizacao-economica-global-em-risco-com-final-da-guerra-da-ucrania