Associação Brasileira dos Jornalistas

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A soberania nacional incomoda muita gente

A viagem do Presidente Lula à Rússia e à China, da qual participei, causou espanto na cobertura de parte da imprensa brasileira, furor em comentaristas, provocou editoriais inconformados com a soberania nacional resgatada, com o reposicionamento do Brasil na geopolítica global, e com nossa política externa ativa e altiva.

A reação foi como se o Governo Lula tivesse cometido uma heresia ao tratar de nossos interesses com nações euroasiáticas, deixado de seguir os cânones do alinhamento com o império do Norte – um país referência de democracia liberal que está sendo institucionalmente desmanchado, financeiramente inviabilizado – com uma dívida pública de 124,40% do PIB, (cerca de US$ 38 trilhõe), e o dólar em franca desvalorização, ameaçado de deixar de ser moeda reguladora do comércio internacional.

Tentaram ridicularizar uma das mais importantes visitas de Estado de um governo brasileiro. Durante vários dias usaram um comentário pertinente da primeira-dama, Janja Lula da Silva, no jantar dos presidentes Lula e Xi Jinping, para desqualificar, tirar o brilho e o sucesso da visita. Mas não conseguiram.

A preocupação da Primeira-Dama com a violência contra mulheres, crianças e adolescentes, nas redes sociais, objeto da chacota de parte da imprensa brasileira, é por demais conhecida e aquele momento de informalidade entre autoridades foi oportuno para comentar um assunto que aflige o mundo de hoje. Num vídeo, a primeira-dama da França, Brigitte Macron, se solidarizou com a primeira-dama Janja, se prontificou participar da campanha contra violência a crianças e adolescentes nas redes sociais. Brigite Macron falou sobre medidas adotadas na França no combate ao bullying contra crianças e agradeceu à amizade franco-brasileira.

Qual o problema de dois países da importância do Brasil, da China, da França, trocarem, soberanamente, experiências de inteligência tecnológica e adoção de medidas para conter a violência nas redes? Por que essa postura reacionária, antinacional?

O Brasil ainda não tem uma lei que regulamenta o convívio virtual porque o Governo Lula encontra dificuldade no Congresso Nacional, de maioria conservadora, para aprovação de medidas necessárias. A regulamentação ainda é vista como “censura” por grande parte do parlamento. União Europeia, Reino Unido, Estados Unidos, China, França, Alemanha, Canadá, Portugal, cada um, conforme suas necessidades e possibilidades, já dispõem de leis reguladoras.

Parece que os inconformados com a soberania resgatada, que tanto atacaram o Governo Lula, por ter feito essa viagem, demonstraram não entender que o mundo mudou, que a guerra fria foi congelada no tempo e a arquitetura institucional do pós-Guerra (ONU, Banco Mundial, FMI e outras) se tornou obsoleta. Não serve mais aos propósitos para os quais foram criados.

Têm dificuldade de admitir que a China, filha da globalização, com uma população de 1,4 bilhão de habitantes, é a segunda maior potência econômica e tecnológica do mundo, e o maior parceiro comercial do Brasil. Tratam como irrelevante o grande salto do comércio sino-brasileiro.

Em 2004, na primeira viagem do Presidente Lula à China, exportávamos pouco mais de US$ 5 bilhões. Em 2024, a China foi o principal destino das exportações brasileiras (28%), com vendas totalizadas em mais de US$ 94 bilhões.

Como parte da programação da viagem, o Governo do Presidente Lula realizou o Seminário China-Brasil com mais de 700 empresários dos dois países, para discutir cooperação, ampliação de negócios, investimentos e pauta comercial entre os dois países. A Apex mapeou mais de 400 novas oportunidades de exportações brasileiras para a China.

Na reunião da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (CELAC), o presidente Lula destacou a importância da cooperação entre a China, América Latina e Caribe na articulação do Sul Global, e enfatizou a necessidade de uma reforma da governança global que reflita a diversidade do planeta.

Defendeu o multilateralismo, a ampliação da conectividade, medidas para facilitar o comércio e o investimento; a cooperação para capacitação industrial; promoção de programas espaciais, de inteligência artificial; intercâmbios para melhoria da governança; e estratégias para o desenvolvimento conjunto da China, América Latina e Caribe.

A visita oficial à China resultou em 20 acordos estratégicos para o Brasil e reafirmação da parceria sino-brasileira como pilar da integração Sul-Sul.

Não deve ser fácil para os agourentos tentarem manter o discurso de salvação do projeto neoliberal – reciclado no Consenso de Washington – que resultou numa economia para o 1% da população na qual 53 pessoas detêm a mesma riqueza de 3,6 bilhões de pobres do planeta.

Do fracasso do modelo institucional do pós-Guerra e do projeto neoliberal, restaram vozes dos seus órfãos na imprensa, repetindo jargões surrados da ideologia mãe da tragédia social e ambiental, da apropriação e da hiperconcentração da renda de quem trabalha e produz. A integração do Sul Global é a novidade do século. Quem viver verá!

Foto: Ricardo Stuckert/PR

FONTE: https://www.brasil247.com/blog/a-soberania-nacional-incomoda-muita-gente