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Bloomberg aponta omissão de Roberto Campos Neto na fiscalização do Banco Master

FGC e grandes bancos alertaram por anos sobre riscos da instituição, liquidada após denúncias de fraude, mas advertências não foram atendidas.

247 – O Banco Central do Brasil recebeu, ao longo de vários anos, alertas formais e informais sobre riscos crescentes envolvendo o Banco Master, liquidado nesta semana em meio a acusações de fraude e má gestão de ativos.

As revelações foram publicadas pela Bloomberg, que teve acesso a relatos de executivos do Fundo Garantidor de Créditos (FGC) e de grandes bancos brasileiros que, repetidamente, manifestaram preocupação sobre o ritmo acelerado de expansão da instituição e sobre a existência de ativos considerados opacos. A mesma denúncia foi feita hoje pelo jornalista Aquiles Lins, colunista do Brasil 247.

Segundo a reportagem, executivos do FGC — principal órgão responsável por proteger depositantes — enviaram diversas cartas de advertência ao Banco Central, enquanto dirigentes de grandes bancos, que financiam o fundo, também procuraram diretamente a autoridade monetária. Fontes ouvidas pela Bloomberg afirmam que algumas dessas conversas foram feitas pessoalmente com o então presidente do BC, Roberto Campos Neto, que teria prometido agir diante dos alertas.

Campos Neto deixou o comando da autarquia em janeiro e hoje integra o conselho da Nu Holdings. Ele foi sucedido por Gabriel Galípolo, que agora enfrenta o desafio de conduzir os desdobramentos da maior liquidação bancária já acionada pelo FGC.

FGC nega comunicações fora dos canais oficiais

Em nota enviada à Bloomberg, o FGC afirmou que mantém, desde 2019, um acordo de cooperação com o Banco Central que prevê troca regular de informações, mas negou reconhecer declarações atribuídas a seus administradores de forma anônima, bem como a existência de comunicações fora dos canais institucionais.

O ex-presidente do BC, Roberto Campos Neto, não comentou o caso. A autarquia também não respondeu imediatamente aos pedidos de posicionamento.

A maior liquidação da história do FGC

Na terça-feira, o Banco Central decretou a liquidação extrajudicial do Banco Master. O FGC informou que precisará desembolsar 41 bilhões de reais para indenizar aproximadamente 1,6 milhão de credores, o maior valor já mobilizado pelo fundo. O impacto pode chegar a 55 bilhões de reais se outras instituições menores vinculadas ao caso também forem liquidadas, segundo fontes consultadas pela reportagem.

O FGC possui atualmente cerca de 160 bilhões de reais em ativos, incluindo 122 bilhões de reais em liquidez imediata, mas será necessário um processo de recapitalização a partir do próximo ano. Os maiores bancos do país deverão antecipar contribuições futuras para recompor o caixa, em um processo que pode levar anos.

O fundo destacou que não há prazo regulamentar para o reabastecimento e que o tema será discutido levando em conta os efeitos sistêmicos e a necessidade de preservar sua capitalização.

Prisão do CEO e ativos difíceis de vender

O CEO do Master, Daniel Vorcaro, foi preso no âmbito de uma investigação da Polícia Federal sobre fraudes. Vorcaro e seus sócios adquiriram um pequeno banco em 2017, modificaram sua estratégia e impulsionaram seu crescimento agressivo a partir de captação com investidores individuais, amparados pela cobertura do FGC — mecanismo que exige maiores contribuições quanto maiores forem os depósitos.

Vorcaro afirmou previamente estar disposto a cooperar com as autoridades. O FGC cobre até 250 mil reais por investidor, com limite de 1 milhão de reais a cada quatro anos.

Grande parte dos ativos do Master era composta por fundos de crédito e fundos de participação em ações — instrumentos de baixa liquidez em comparação com títulos públicos. Segundo a Moody’s, esses ativos representavam 69% das reservas líquidas do banco em junho de 2024.

Diretores de outras instituições financeiras disseram à Bloomberg, sob anonimato, que havia preocupação generalizada no mercado pela dificuldade de se compreender exatamente qual era o modelo de negócios do Master — ponto que também foi levado ao Banco Central.

Operações com o BRB e rejeição de compra pelo BC

O colapso do Banco Master também envolve operações investigadas com o Banco de Brasília (BRB). No fim de 2024, a Polícia Federal e o Ministério Público abriram investigação sobre a venda de carteiras de crédito do Master ao banco brasiliense.

Em março deste ano, o BRB chegou a anunciar a compra do Master, negócio que foi duramente criticado por representar, segundo analistas, um possível resgate público a uma instituição considerada de alto risco. Em setembro, o Banco Central vetou a operação.

O então presidente do BRB, Paulo Henrique Costa, deixou o cargo e, segundo a imprensa local, está atualmente nos Estados Unidos.

Em nota enviada à Bloomberg, o BRB afirmou que notificou o Banco Central sobre suas transações com o Master assim que identificou o envolvimento não autorizado de terceiros, violando cláusula que exigia que todos os créditos tivessem origem no próprio banco. A instituição disse ainda que cumpriu imediatamente a determinação do BC para interromper as operações.

Impacto sistêmico e alerta para o modelo de supervisão

A reportagem da Bloomberg destaca que o caso Master se tornou um dos maiores testes recentes para o sistema de regulação financeira brasileiro. A sucessão de alertas ignorados e a magnitude do rombo que recairá sobre o FGC colocam em xeque a eficácia da supervisão exercida pelo Banco Central durante a gestão de Roberto Campos Neto.

O episódio reacende o debate sobre falhas estruturais no monitoramento de instituições que crescem rápido demais, com estruturas complexas e alta dependência de captação coberta pelo seguro de depósitos.

Foto: Vinicius Loures / Câmara dos Deputados

FONTE: https://www.brasil247.com/economia/bloomberg-aponta-omissao-de-roberto-campos-neto-na-fiscalizacao-do-banco-master