Negociadores brasileiros usaram a ameaça chinesa como argumento para convencer o governo de Donald Trump a recalibrar sua relação com o Brasil e iniciar um diálogo, após meses de tensão e uma escalada nos ataques contra o país.
O UOL obteve com exclusividade documentos preparados pelo setor privado brasileiro e que foram usados como base em reuniões no Departamento de Comércio, no Escritório de Comércio dos EUA (USTR), no Departamento do Tesouro e no Departamento de Estado.
O trabalho nos bastidores foi considerado como fundamental para reabrir o diálogo entre os dois países. Empresários brasileiros ainda coordenaram suas posições com o governo Lula, principalmente com o vice-presidente, Geraldo Alckmin.
A ofensiva levou Trump a aceitar dialogar com Lula e, depois de um breve encontro na ONU em setembro, os dois líderes realizaram uma chamada telefônica por 30 minutos na última segunda-feira.
Um dos trunfos, segundo negociadores, foi o argumento chinês. O que o Brasil alegou é que, com as tarifas contra os produtos nacionais, os EUA aumentariam sua dependência justamente em relação ao seu maior rival: a China.
Conforme os dados apresentados pelos brasileiros, a China é o principal concorrente de quase metade — 48,5% — dos produtos industriais que o Brasil exporta para os EUA. Esses bens, atualmente, sofrem uma tarifa adicional de 40% imposta pelo governo Trump.
O resultado, segundo o argumento, é de que as tarifas contra o Brasil irão aumentar o déficit comercial dos EUA e a dependência das cadeias de suprimentos chinesas. Em alguns setores, essa substituição prejudicaria diretamente as subsidiárias americanas que operam no Brasil.
O argumento foi ainda de que, em contraste, importar certos produtos do Brasil apoia as empresas norte-americanas, ao mesmo tempo que promove os interesses econômicos e estratégicos dos EUA.
No governo Trump, a China é considerada como a maior rival para os interesses norte-americanos. Marco Rubio, que irá liderar as negociações com o Brasil, chegou a alertar ao Congresso dos EUA que a China é “o maior desafio existencial na história dos EUA”, superando até mesmo a URSS durante a Guerra Fria.
Em reuniões com diplomatas brasileiros ainda antes das eleições de 2024, assessores de Trump explicaram que o novo governo não iria tolerar uma ampliação da influência chinesa na América Latina.
Competitividade
Os negociadores brasileiros ainda apresentaram outro argumento ao governo Trump, apontando que a importação de bens nacionais ajudaria a indústria dos EUA a ser competitiva no mercado internacional.
Os dados apontaram que empresas norte-americanas dependem de fornecedores brasileiros para insumos ou bens complementares essenciais à sua competitividade em setores nos quais os EUA buscam promover investimentos e empregos, como baterias, semicondutores, aço e utensílios domésticos.
A tese dos brasileiros foi de que desenvolver fornecedores alternativos em outros lugares levaria tempo, deixando as empresas norte-americanas expostas a custos mais altos e menor competitividade.
Um dos exemplos usados foi o óxido de nióbio. O produto brasileiro representa 93% de toda a importação norte-americana e é usado para a fabricação de chips, eletrônicos e baterias. Outro exemplo é o hidróxido de alumínio brasileiro, que ocupa 47,5% da importação dos EUA e que é central para o setor farmacêutico, cosmético e químico.
Já madeira de coníferas do Brasil representa 45,3% de toda a importação norte-americana e tem um papel importante na construção, celulose e móveis.
FOTO: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Donald_Trump_and_Xi_Jinping_meets_at_2018_G20_Summit.jpg
FONTE: https://noticias.uol.com.br/colunas/jamil-chade/2025/10/09/brasileiros-usaram-ameaca-chinesa-para-convencer-trump-a-abrir-dialogo.htm