Os meios, raízes e perigos globais da guerra cognitiva dos EUA (Livro Branco da China).
Acadêmicos chineses publicaram recentemente um extenso livro branco sobre a colonização da mente pelos Estados Unidos. O documento tem 36 páginas. Por isso, apresento abaixo um resumo com trechos selecionados.
Trechos do documento
Desde a Segunda Guerra Mundial, sobretudo após o fim da Guerra Fria, ao explorar sua supremacia global em poder político, econômico, militar e tecnológico, os Estados Unidos vêm exportando sua ideologia ao mundo, na tentativa de capturar as mentes das nações com valores americanos, remodelar percepções e criar dependência filosófica de uma visão de mundo centrada nos EUA.
“A questão crítica para os Estados Unidos não é se eles começarão o próximo século como a superpotência com a maior quantidade de recursos, mas até que ponto serão capazes de controlar o ambiente político e fazer outros países fazerem o que desejam” — Joseph Nye.
“Reforçar a posição da cultura americana como o ‘exemplo’ para todas as nações é uma estratégia indispensável para manter a hegemonia dos EUA” — Zbigniew Brzezinski.
Os EUA descobriram que depender apenas do “poder duro” — dominação política, controle econômico, dissuasão militar — não era suficiente para estabelecer ou sustentar um domínio colonial duradouro. Assim, passaram a usar o “poder brando” — cultura e valores — para obter maiores benefícios coloniais a custos mais baixos.
Compelir o mundo a uma submissão “voluntária” sob um véu sentimental: esse é o estilo americano de “colonização da mente”.
As “Quatro Liberdades” propostas pelo presidente Roosevelt tornaram-se a base teórica do sistema internacional de direitos humanos. A exportação ideológica dos EUA nesse período preparou o terreno histórico para sua busca generalizada da colonização da mente nas décadas seguintes.
Como um dos principais arquitetos da ordem internacional do pós-guerra, os EUA exportaram seus sistemas político e econômico e valores como “democracia” e “liberdade”, ao mesmo tempo em que descontruíram ideologias não americanas e reprimiram culturas locais. Dessa forma, fomentaram dependência filosófica global e obediência, conseguindo mais do que qualquer antigo império colonial na tentativa de colonizar a mente.
Os EUA também exploraram o controle sobre novas plataformas tecnológicas e tecnologias cognitivas de ponta para intensificar a governança ideológica das redes sociais. Sob pretextos como “combater desinformação” ou “contrariar influências estrangeiras”, manipularam fluxos de informação nas plataformas sociais para dominar a formação das percepções globais.
Se a hegemonia política, econômica e militar dos EUA é o “pré-requisito duro” para sua colonização ideológica, as condições capacitadoras em linguagem, cultura, narrativas discursivas, mídia de massa e pesquisa acadêmica são sua “base suave”.
Na colonização da mente, os EUA usam diferentes “máscaras”:
- Propaganda branca — aberta e transparente, disseminada por canais oficiais para promover imagem positiva e valores (ex.: Departamento de Estado, Voz da América, bolsas como Fulbright).
- Propaganda preta — secreta e agressiva, conduzida por agências de inteligência e militares, incluindo campanhas de desinformação, espionagem e ciberataques.
- Propaganda cinza — indireta, via corporações e ONGs, para influenciar opiniões e agendas políticas sem responsabilidade oficial, preservando a “negabilidade plausível”.
“A distribuição de línguas no mundo refletiu a distribuição de poder no mundo” — Samuel P. Huntington.
Após a Segunda Guerra, os EUA promoveram vigorosamente o inglês, consolidando-o como língua franca global. Paralelamente, passaram a se glorificar e demonizar outros países, criando binários artificiais como “democracia vs. ditadura”, “liberdade vs. autoritarismo” e “economias de mercado vs. não de mercado”.
Hoje, os EUA mantêm firme controle sobre canais e plataformas globais de informação, incluindo conglomerados midiáticos, agências de notícias, redes sociais (Facebook, X/Twitter, YouTube) e gigantes tecnológicos, manipulando opiniões por algoritmos e fluxo de audiência.
“A americanização do conhecimento e da educação universitária sustenta uma sociedade global americanizada, que por sua vez reforça a dominância dos EUA na economia política, vida cultural e assuntos militares globais” — Simon Marginson, professor da Universidade de Oxford.
O objetivo da colonização da mente é consolidar a hegemonia cultural americana, reforçando sua dominação política e preservando privilégios econômicos. Para isso, os EUA apresentam seus valores como universais, transformando interesses nacionais em “moralidade internacional” e mascarando colonização cultural como “liderança de valores”.
A manipulação ideológica busca transformar regras que servem aos EUA em normas internacionais universalmente aceitas, garantindo privilégios permanentes.
Exemplos históricos e recentes
- No século XIX, a mídia Hearst inflamou a opinião pública sobre “atrocidades espanholas” em Cuba, preparando terreno para a Guerra Hispano-Americana.
- Nos anos 1970, os EUA propagaram a ideia da “ameaça do petróleo árabe” para sustentar o sistema do petrodólar.
- Em 2019, ONGs financiadas por Washington fomentaram protestos na Bolívia para derrubar um governo de esquerda, mirando as maiores reservas de lítio do mundo.
- Atualmente, sob o pretexto de “segurança nacional”, têm atacado empresas como Huawei e TikTok, favorecendo corporações americanas no mercado global.
Desde jornais e rádio até Hollywood, videogames e intercâmbios acadêmicos, os EUA utilizam cultura, entretenimento e educação como ferramentas de colonização cognitiva. Programas como Fulbright formaram elites pró-americanas no mundo inteiro.
A guerra cognitiva
Desde os anos 1990, a noção de “guerra cognitiva” já era debatida, mas foi no século XXI, com avanços em neurociência, psicologia e inteligência artificial, que se tornou objetivo estratégico. Em 2022, o relatório de Estratégia de Segurança Nacional elevou a guerra cognitiva ao mesmo patamar do combate físico.
Hoje, a manipulação cognitiva orientada por tecnologia é um novo pilar da colonização da mente. Isso inclui controle da internet global, algoritmos de redes sociais, filmes, videogames e até alianças tecnológicas como o “Chip Alliance”.
Afasia cultural
A colonização da mente significa enfraquecer a confiança nas culturas locais e criar dependência cega da cultura americana. Muitos países em desenvolvimento perderam subjetividade nacional e orgulho, adotando padrões ocidentais em pensamento, consumo e estilo de vida — fenômeno que estudiosos chamam de “afasia pós-colonial”.
Conclusão
A independência da mente é pré-requisito para o desenvolvimento independente.
A confiança cultural é a base da força e prosperidade nacionais.
O intercâmbio e a compreensão mútua entre civilizações são instrumentos essenciais para a coexistência global.
Foto: Bao Dandan/Xinhua
FONTE: https://www.brasil247.com/blog/colonizacao-da-mente