Em reunião internacional, presidente afirmou que sem financiamento não haverá transformação e pediu prioridade ao combate à pobreza.
247 – Durante a 2ª Reunião do Conselho de Campeões da Aliança Global contra a Fome e a Pobreza, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez um discurso contundente em defesa de mais investimentos para enfrentar a desigualdade e a insegurança alimentar. O encontro marcou a inauguração do Mecanismo de Apoio da Aliança, que passa a contar com sede, secretariado e direção.
Lula ressaltou que, em apenas um ano de funcionamento, a Aliança já reúne 200 membros — entre países, organizações internacionais, fundações, ONGs e instituições financeiras. Ele destacou a participação ativa da Espanha na liderança do fórum e a contribuição de países como Noruega, Portugal e Brasil, que asseguraram parte do financiamento necessário até 2030.
Projetos em andamento e foco na cooperação internacional
O presidente detalhou nove projetos-piloto já em fase de implementação. Entre eles, a criação de programas de assistência a mulheres e crianças na Palestina, onde a desnutrição tem sido usada como “arma de guerra”. Também citou iniciativas de transferência de renda no Haiti e na Zâmbia, acesso à água potável no Quênia, fortalecimento da agricultura familiar na Etiópia e expansão do sistema de merenda escolar no Benin.
“Não há melhor estímulo para a economia global do que o combate à fome e à pobreza”, afirmou Lula, ao pedir mudanças na atuação de bancos multilaterais e países doadores. Para ele, programas de ajuste fiscal não podem justificar cortes em investimentos sociais, sob risco de comprometer o futuro das próximas gerações.
O apelo por mais recursos e inclusão social
Lula alertou que, caso não haja ação imediata, quase 9% da população mundial seguirá em extrema pobreza até 2030. Ele criticou a queda de 23% na ajuda oficial ao desenvolvimento em comparação ao período pré-pandemia e pediu prioridade na alocação de recursos financeiros.
Em sua fala, reforçou a necessidade de os governos nacionais assumirem compromisso real com a população mais vulnerável: “É hora de colocar os pobres no orçamento. A inclusão social não pode ser apenas uma promessa — ela precisa estar refletida na arquitetura fiscal, nos investimentos públicos e nos planos de transformação produtiva”.
O Brasil como exemplo de políticas públicas
O presidente destacou avanços recentes no país, como a saída do Brasil do Mapa da Fome da FAO graças a políticas integradas de transferência de renda, fortalecimento da agricultura familiar, geração de empregos e valorização do salário mínimo. Ele também citou a aprovação, pela Câmara dos Deputados, da isenção do imposto de renda para quem ganha até cerca de mil dólares mensais, medida acompanhada de tributação progressiva para rendas mais altas.
Além disso, Lula anunciou o Plano Nacional de Cuidados, que tem como objetivo reduzir a sobrecarga do trabalho doméstico e não remunerado sobre as mulheres.
Perspectivas globais e próximos passos
O presidente agradeceu ao Catar por sediar o primeiro Encontro de Líderes da Aliança, marcado para 3 de novembro, e informou que o Brasil será representado pelo vice-presidente Geraldo Alckmin e pelo ministro Wellington Dias. Ele também destacou que, na COP30, em Belém, pretende colocar a segurança alimentar no centro da agenda climática, com uma declaração conjunta sobre fome, pobreza e mudanças do clima.
Lula concluiu reforçando sua visão de futuro: um mundo em que nenhuma criança vá à escola com fome, nenhum trabalhador fique sem alimento e nenhum agricultor seja excluído do crédito e da assistência técnica. “Somente um novo modelo de desenvolvimento justo e sustentável poderá assegurar um futuro para as próximas gerações”, declarou.
Leia o discurso na íntegra:
É uma enorme satisfação encerrar a 2ª Reunião do Conselho de Campeões da Aliança Global contra a Fome e a Pobreza.
Quero cumprimentar a todos pelo trabalho durante este ano. O empenho desse Conselho nos permitiu chegar até aqui.
Vivemos em um mundo hiper conectado, com inteligência artificial, avanços científicos e até planos de habitar a lua.
Mas a persistência da fome e da pobreza são as provas mais dolorosas de que falhamos como comunidade global.
Foi com esse senso de urgência que o Brasil, ao assumir a presidência do G20, propôs a criação desta Aliança Global.
A fórmula é simples:
1) Reunir políticas públicas que deram certo
2) Articular essas políticas com recursos e conhecimento
3) Apostar em cooperação, sem condicionalidades e
4) Garantir que a adaptação e a implementação de programas seja liderada pelos países receptores.
O objetivo é dobrar esforços para o cumprimento das Metas 1 e 2 da Agenda 2030.
Em apenas um ano de funcionamento da Aliança, alcançamos 200 membros: 103 países, 53 fundações e ONGs, 30 organizações internacionais e 14 instituições financeiras.
A Espanha tem sido parceira na liderança deste Fórum.
Hoje, damos um passo decisivo: inauguramos o Mecanismo de Apoio da Aliança, com sede, secretariado e direção.
Com contribuições da Noruega, Portugal, Espanha e Brasil, asseguramos parte dos recursos necessários para o funcionamento do Mecanismo até 2030.
A FAO será nosso braço técnico.
Já temos 9 projetos-piloto prontos.
Na Palestina, onde a desnutrição tem sido cruelmente usada como arma de guerra, vamos apoiar programas de atenção especial voltados às mulheres e crianças.
Junto com Haiti e Zâmbia, implementaremos iniciativas de transferência de renda.
No Quênia, nosso foco será o acesso à água potável.
A escolha da Etiópia foi guiada pela urgência de fortalecer a agricultura familiar.
No Benin, apoiaremos a expansão do sistema de merenda escolar.
Em Ruanda, trabalharemos pela inclusão socioeconômica.
Reconhecendo tanto as vulnerabilidades quanto a força transformadora das mulheres, a Tanzânia quer dedicar atenção especial a elas e às crianças.
Ainda temos estudos para projetos em Moçambique, Indonésia, Camboja, Bangladesh e República Dominicana.
Mas sejamos claros: sem recursos financeiros não haverá transformação.
Ano passado a ajuda oficial ao desenvolvimento registrou uma queda de 23% em relação aos níveis pré-pandêmicos.
Essa retração atinge em cheio os países mais pobres e endividados, sobretudo na África, onde a insegurança alimentar cresceu de forma alarmante.
Se não agirmos com urgência, em 2030 ainda teremos quase 9% da população mundial vivendo em situação de extrema pobreza.
Por isso, faço dois apelos urgentes.
Primeiro, aos bancos multilaterais e países doadores:
É necessário rever as prioridades.
Programas de ajuste fiscal não são um fim em si mesmo que justifiquem a redução do investimento em desenvolvimento humano e social.
Não há melhor estímulo para a economia global do que o combate à fome e à pobreza.
Os recursos disponíveis devem ser mobilizados para enfrentar os desafios reais da humanidade.
Quando isso acontece, o consumo aumenta, o mercado aquece e novos ciclos de desenvolvimento florescem.
Meu segundo apelo é para aos governos nacionais.
É hora de colocar os pobres no orçamento.
A inclusão social não pode ser apenas uma promessa — ela precisa estar refletida na arquitetura fiscal, nos investimentos públicos e nos planos de transformação produtiva.
O Brasil voltou a sair do Mapa da Fome da FAO por conta de políticas integradas de transferência de renda, fortalecimento da agricultura familiar, merenda escolar, geração de empregos e aumento de salário-mínimo.
Instituímos ainda um Plano Nacional de Cuidados que deve tirar o fardo do trabalho doméstico e não remunerado das mulheres.
Neste mês, a Câmara de Deputados aprovou a isenção do imposto de renda para quem ganha até aproximadamente mil dólares mensais, e o aumento de 10% para quem ganha mais de 100 mil dólares por ano.
Essa progressividade tributária vai ampliar os recursos para o financiamento se políticas públicas essenciais.
Meus amigos e minhas amigas,
Quero agradecer o governo do Catar, na figura do Emir Tamim ibn Hamad Al Thani, por sediar o primeiro Encontro de Líderes da Aliança, no dia 3 de novembro, à margem da Segunda Cúpula do Desenvolvimento Social da ONU.
Devido à proximidade com a Cúpula de Líderes da COP, infelizmente, eu não poderei comparecer.
Mas o vice-presidente Geraldo Alckmin e o ministro Wellington Dias [Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome] representarão o Brasil.
Mostraremos que a Aliança é uma resposta concreta e real.
Na COP30, em Belém, queremos adotar uma Declaração sobre Fome, Pobreza e Clima.
A segurança alimentar precisa estar no centro da ação climática.
As Contribuições Nacionalmente Determinadas precisam incluir proteção social, resiliência do pequeno produtor e soluções que gerem renda e preservem a biodiversidade.
Somente um novo modelo de desenvolvimento justo e sustentável poderá assegurar um futuro para as próximas gerações.
Nesse futuro,
» Nenhuma mulher ou homem terá que trabalhar sem se alimentar
» Nenhuma criança deve estudar com fome
» Nenhum agricultor deve sofrer com falta de crédito ou de assistência técnica
» Ninguém deve viver sem acesso à água
Sigamos com seriedade e coragem.
Muito obrigado.
Foto: Ricardo Stuckert/PR
FONTE: https://www.brasil247.com/mundo/lula-defende-alianca-global-contra-a-fome-e-cobra-recursos-para-combater-desigualdade