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Kobori: China venceu porque abandonou o neoliberalismo

Professor defende papel ativo do Estado no desenvolvimento e critica modelo liberal adotado pelo Brasil após o Consenso de Washington.

247 – Em entrevista ao canal À Deriva, o professor José Kobori fez uma crítica contundente ao discurso do Estado mínimo e ao modelo neoliberal que predominou nas últimas décadas em países como o Brasil. Para ele, a ascensão econômica da China se deu justamente por ter rejeitado essa cartilha liberal e adotado um Estado forte e estratégico. “A China fez exatamente o que os Estados Unidos fizeram no passado: protegeu seu mercado, investiu em tecnologia, usou o poder do Estado para crescer”, afirmou.

Kobori comparou o processo chinês com o caminho trilhado pelo Brasil a partir da década de 1990, após o Consenso de Washington. Enquanto os chineses protegeram suas empresas e exigiram transferência de tecnologia, o Brasil abriu seu mercado e desmantelou sua base industrial. “A gente fez exatamente o que os Estados Unidos pregaram, e nos demos mal”, lamentou.

O papel da abstração e do contrato social

Na entrevista, Kobori explicou que o Estado é uma das grandes abstrações criadas pelos seres humanos para possibilitar a vida em sociedade. Citando autores como Thomas Hobbes, ele relembrou que o Estado nasceu para impedir que as relações sociais descambassem para a violência. “O Estado foi criado para proteger o mais fraco. O mais forte não precisa do Estado.”

Segundo ele, o problema não está no tamanho do Estado, mas sim em sua captura pelas elites econômicas. “Quem domina o Estado é o poder econômico. O poder econômico se traduz em poder político”, afirmou. Para Kobori, o discurso de que o Estado prejudica os mais pobres por cobrar impostos é, na verdade, uma retórica manipuladora das elites para manter o sistema tributário regressivo.

“O Estado precisa ser grande e forte”

Kobori defendeu um Estado grande, forte e atuante, principalmente em países em desenvolvimento como o Brasil. “Todos os países que hoje pregam o Estado mínimo já foram Estados grandes em algum momento, foi assim que eles chegaram lá”, afirmou. Ele criticou o discurso de austeridade que impede países pobres de seguir o mesmo caminho. “É o famoso ‘chutando a escada’, como diz o livro do coreano Ha-Joon Chang.”

A Coreia do Sul e a própria China foram citadas como exemplos bem-sucedidos de nações que usaram o Estado como indutor do desenvolvimento. “Eles protegeram seu mercado, levantaram barreiras tarifárias, exigiram transferência de tecnologia. E hoje colhem os frutos disso.”

O Brasil e a desindustrialização

Ao falar do Brasil, Kobori lamentou a destruição da indústria nacional após a abertura econômica iniciada nos anos 1990. “A produção industrial brasileira na década de 1980 era equivalente à da China e da Coreia do Sul somadas. Hoje, estamos muito atrás.” Ele lembrou que setores estratégicos como o de defesa e o de implementos agrícolas foram abandonados, e muitas empresas desapareceram ou foram compradas por estrangeiras.

Como exemplo de sucesso, citou a Embraer, protegida e incentivada pelo Estado brasileiro durante anos. “Hoje ela é uma empresa de alta tecnologia, que concorre com gigantes como Boeing e Airbus. Isso só foi possível porque o Estado acreditou e investiu.”

Crítica ao modelo norte-americano

Kobori também criticou o modelo fiscal e tributário adotado pelos Estados Unidos sob o comando do presidente Donald Trump. Para ele, a teoria do “trickle-down economics” (economia do gotejamento) — que defende a isenção fiscal dos mais ricos e grandes corporações como forma de estimular o crescimento — fracassou em todos os lugares onde foi aplicada. “Toda isenção dada aos mais ricos vira mais acúmulo de riqueza, nunca se distribui.”

Para encerrar, o professor alertou que o discurso contra o Estado, quando analisado em profundidade, revela-se uma ferramenta de manutenção do status quo. “A elite usa esse discurso para nos convencer de que o Estado atrapalha. Mas, na verdade, ela é quem controla o Estado e não quer abrir mão desse poder.” Assista:

Foto: Nicolas Iwashita / Brasil 247

FONTE: https://www.brasil247.com/economia/kobori-china-venceu-porque-abandonou-o-neoliberalismo