O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), marcou para amanhã a sessão no Congresso Nacional que votará os vetos do presidente Lula à lei do licenciamento ambiental. O governo já trabalha com a possibilidade de que eles sejam derrubados.
O que aconteceu
Planalto foi avisado que Lula deve sofrer nova derrota no Congresso. Segundo a colunista do UOL Daniela Lima, o governo recebeu ontem o alerta de que o clima entre os parlamentares é de derrubada dos limites que o presidente impôs à flexibilização das normas ambientais. Uma ala defende que a gestão caia atirando, e o governo estuda formas de reagir, ainda que publicamente, ao possível novo revés.
Em agosto, Lula vetou 63 dos quase 400 artigos do projeto que trata das normas para o licenciamento ambiental. O petista derrubou pontos que permitiam a implementação da licença automática para empreendimentos, reforçando a proteção de áreas sensíveis e garantindo a exigência de estudos de impacto ambiental para projetos prioritários (veja no fim do texto quais os principais itens vetados e as justificativas do Executivo).
Segundo a secretária-executiva da Casa Civil, Miriam Belchior, vetos asseguraram direitos de povos indígenas e comunidades quilombolas. Além disso, garantem a “integridade do processo de licenciamento ambiental”, oferece “segurança jurídica aos empreendimentos licenciados” e “torna o licenciamento mais ágil, sem comprometer a sua qualidade.”
Texto aprovado pelo Congresso é chamado pelos ambientalistas de “PL da destruição”. Para especialistas, o projeto facilitaria o desmatamento no Brasil e os vetos feitos pelo presidente ocorreram em pontos críticos da proposta.
Ao justificar os vetos, o governo defendeu a “garantia da proteção ambiental”. Segundo representantes da gestão Lula, a estratégia foi a de derrubar pontos considerados prejudiciais ao meio ambiente e propor, seja por meio de um novo projeto de lei ou por meio de uma medida provisória, alternativas ao texto aprovado pelo Legislativo.
Medida foi comemorada por ambientalistas, que chegaram a defender o veto integral ao projeto. Integrantes do governo também eram contra o texto —-a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, foi uma das que orientou o presidente a derrubar pontos da proposta. Defensores do projeto, como a bancada do agronegócio, afirmam que as novas regras vão desburocratizar processos para obtenção de licenças ambientais.
Segundo Marina, o governo também levou a sociedade civil em conta. “Pesquisa que foi feita deu conta de que mais de 70% da opinião pública brasileira estava preocupada com essa questão”, afirmou a ministra na ocasião do anúncio dos vetos.
Na época, o governo editou uma MP (medida provisória) para que a LAE (Licença Ambiental Especial) passe a valer imediatamente. Ela permite que o governo federal escolha projetos estratégicos que têm prioridade de avaliação. Como o UOL mostrou, interessado no petróleo no rio Amazonas, o presidente do Congresso, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), usou seu peso político em prol dessa alteração. Segundo o governo, a MP mantém o texto sugerido pela emenda de Alcolumbre quase integramente.
O governo anunciou ainda que enviaria um projeto de lei com urgência constitucional sobre o tema. A secretária-executiva da Casa Civil, Miriam Belchior, explicou que a proposta resolveria “questões importantes” que ficariam em um “vácuo” na legislação com os vetos.
COP30
Gleisi Hoffmann conversou com Alcolumbre nesta segunda-feira sobre votação dos vetos. Segundo o líder do governo no Senado, Randolfe Rodrigues (PT-AP), a ministra da Casa Civil argumentou o Brasil passaria um péssimo recado para o mundo ao derrubar os vetos às vésperas da COP30, a conferência da ONU (Organização das Nações Unidas) sobre o clima, que o país sediará em novembro.
O problema é que até integrantes da base do governo querem derrubar parte dos vetos para dar tração a projetos em suas zonas eleitorais. Segundo a colunista do UOL Daniela Lima, o Planalto foi procurado para opinar sobre quais vetos poderiam cair —e avaliou que os 63 dispositivos sustados só bancam o essencial para um país que prega comprometimento com a crise climática e que vai sediar a COP30.
Senadores e deputados da região Norte, por exemplo, anseiam pela autorização da exploração de petróleo na foz do Amazonas. Eles travam uma batalha com a ministra e o Ibama pela liberação do projeto, que é defendido por Lula.
Os principais vetos e os argumentos do Executivo
1. Restrição da Licença por Adesão e Compromisso (LAC) a empreendimentos de baixo potencial poluidor:
O que foi feito: Vetada a ampliação para atividades de médio potencial poluidor.
Por quê? Evita que empreendimentos de risco relevante, como barragens de rejeitos, realizem licenciamento simplificado sem análise técnica adequada. O Executivo, além de restringir a LAC para baixo potencial de impacto, acrescentava limites ao procedimento autodeclaratório.
2. Assegura que entes federativos respeitem padrões nacionais de critérios e procedimentos:
O que foi feito: Vetados dispositivos que transferiam de forma ampla a cada ente federado, sem padronização, a responsabilidade por estabelecer critérios e procedimentos de licenciamento — como porte, potencial poluidor, tipologias sujeitas a licenciamento, modalidades específicas de licenças e atividades passíveis de LAC.
Por quê? A medida evita uma descentralização que poderia estimular uma competição antiambiental entre os entes federativos, em que a flexibilização de regras ambientais se tornaria moeda de troca para atração de investimentos com potencial de causar danos.
3. Preservação da Mata Atlântica:
O que foi feito: Veto para impedir a retirada do regime de proteção especial previsto na Lei da Mata Atlântica em relação à supressão de floresta nativa.
Por quê? A Mata Atlântica é um bioma reconhecido como patrimônio nacional pela Constituição Federal e já se encontra em situação crítica, com apenas 24% de sua vegetação nativa remanescente.
4. Proteção dos direitos de povos indígenas e comunidades quilombolas:
O que foi feito: Foram vetados dispositivos que restringiam consulta aos órgãos responsáveis pela proteção de povos indígenas e comunidades quilombolas.
Por quê? A limitação proposta no texto do PL aprovado deixaria de fora uma série de povos e territórios em fase de reconhecimento pela Funai e pela Fundação Palmares, contrariando a Constituição Federal. O novo PL assegura a participação de ambos, prevenindo conflitos e fortalecendo a participação social nas decisões que impactam diretamente modos de vida e territórios tradicionais. Assim, mantém o que está previsto no regramento federal específico.
5. Veto à dispensa de análise do Cadastro Ambiental Rural (CAR):
O que foi feito: Vetada a proposta que dispensa o licenciamento ambiental para produtores rurais com CAR ainda pendente de análise pelos órgãos ambientais estaduais.
Por quê? A medida protege o meio ambiente, uma vez que somente serão dispensados do licenciamento os proprietários rurais que tiverem o CAR analisado.
6. Mantém as condicionantes ambientais e medidas compensatórias para impactos diretos e indiretos previsíveis:
O que foi feito: Vetado dispositivo que limitava a aplicação de condicionantes ambientais e medidas compensatórias apenas aos impactos diretos, excluindo os impactos indiretos ou os efeitos sobre serviços públicos agravados pela implantação do empreendimento.
Por quê? A medida assegura que, sempre que houver nexo de causalidade entre o empreendimento e os impactos ambientais — diretos ou indiretos —, possam ser exigidas medidas adequadas de mitigação, compensação ou controle, preservando a efetividade do licenciamento ambiental.
7. Proteção às Unidades de Conservação:
O que foi feito: Vetado artigo que retirava o caráter vinculante de manifestação de órgãos gestores de Unidades de Conservação no licenciamento de empreendimentos que afetem diretamente a unidade ou sua zona de amortecimento.
Por quê? A medida reforça a importância da avaliação técnica especializada na proteção de áreas ambientalmente sensíveis, assegurando que os impactos sobre Unidades de Conservação sejam devidamente analisados e considerados nas decisões de licenciamento pelos órgãos gestores responsáveis por essas áreas.
8. Manutenção da LAE com veto ao processo monofásico:
O que foi feito: A criação da LAE (Licenciamento Ambiental Especial) constitui importante instrumento para modernização do processo de licenciamento. Contudo, foi vetado o dispositivo que estabelecia um procedimento monofásico, que autorizaria a expedição de todas as licenças ao mesmo tempo.
Por quê? Porque o processo monofásico exigiria dos empreendedores antecipação de despesas relevantes antes mesmo de comprovada a viabilidade ambiental do empreendimento, que é um dos primeiros passos do processo. Por outro lado, geraria insegurança jurídica passível de judicialização.
9. Manutenção da responsabilidade de instituições financeiras na concessão de crédito:
O que foi feito: Foi vetado o dispositivo que enfraquecia a responsabilidade de instituições financeiras em casos de danos ambientais de projetos por elas financiados.
Por quê? A medida reforça a importância de que o crédito seja condicionado ao cumprimento da legislação ambiental, estimulando a prevenção de danos e alinhando o financiamento ao desenvolvimento sustentável. Para o Executivo, o financiador deve exigir do empreendedor o licenciamento ambiental antes de conceder o crédito.
FOTO: Marcelo Camargo/Agência Brasil
FONTE: https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2025/10/15/licenciamento-ambiental-vetos-lula-congresso-derrubada.htm