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Moro criou uma Abin particular em Curitiba para grampear autoridades

Houve um tempo em que a República de Curitiba era vendida ao Brasil como um exemplo de pureza, o bunker onde homens de toga, ungidos pela opinião pública e por setores da imprensa, salvariam o país da corrupção. Pois bem. O tempo, esse senhor que não costuma ter pressa, mas tem uma memória implacável, vai confirmando que o método da República de Curitiba guardava mais semelhanças com o submundo do que com os manuais de direito.

A revelação trazida por Daniela Lima, no UOL, sobre a gravação clandestina de Heinz Herwig, então presidente do Tribunal de Contas do estado do Paraná, por um colaborador, confirma uma suspeita de que o então juiz federal e hoje senador Sergio Moro instalou uma Abin paralela e pessoal na 13ª Vara Federal de Curitiba.

Não se tratava de investigação dentro das balizas do devido processo legal, mas de um sistema de grampo sob encomenda, que monitorou autoridades e garantiu informações sobre o tabuleiro político paranaense. E não foi o único caso: a PF apreendeu registros de gravações envolvendo desembargadores do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

O material foi descoberto em uma operação de busca e apreensão na 13ª Vara Federal de Curitiba, realizada pela Polícia Federal e autorizada pelo ministro Dias Toffoli. Ela ocorreu após solicitações do STF por documentos, fitas e gravações que não haviam sido atendidas, mesmo depois da saída de Moro.

Vamos de novo: o presidente de um tribunal de contas foi gravado sem autorização do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em um contexto que foge a qualquer rito democrático, e no qual o resultado ficou em uma gaveta da Justiça Federal e não foi encaminhado ao foro competente.

Para que servia esse material? Para combater o crime ou para manter o controle sobre quem poderia, eventualmente, cruzar o caminho de Moro? Vale lembrar que a linha entre o combate à corrupção e o uso político de informações privilegiadas sempre foi tênue, na 13ª Vara Federal, como pode ser visto através da promiscuidade entre procuradores e juiz, que combinavam o jogo, na Lava Jato.

Se o uso da estrutura pública para espionagem política já é uma chaga na nossa democracia, como vimos em episódios recentes de “Abin paralela” no governo Jair Bolsonaro, descobrir que essa prática ocorria duas décadas atrás, mostra que o buraco é muito mais embaixo.

A República de Curitiba não queria apenas prender corruptos, o que seria mais do que necessário. Ela queria o controle político. E, para isso, parece que não hesitou em criar, no Paraná, um Big Brother autoritário, onde o Grande Irmão usava toga. No final das contas, o combate à corrupção serviu de biombo para um projeto de poder que não suportava a luz do sol, preferindo as sombras dos grampos clandestinos.

Isso pode ter consequências. O PP, partido que criou uma federação com União Brasil de Sergio Moro, não quer apoiá-lo para a disputa ao governo do Paraná no ano que vem. E há gente no seu próprio partido que também é contra essa candidatura. A revelação da arapongagem da época em que era juiz não ajuda nada a convencer políticos.

FOTO: Lula Marques/ Agência Brasil

FONTE: https://noticias.uol.com.br/colunas/leonardo-sakamoto/2025/12/17/moro-criou-uma-abin-particular-em-curitiba-para-grampear-autoridades.htm