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Não se faz mais guerra como antigamente: drones com IA mudaram ‘radicalmente’ disputa entre países

Os veículos aéreos não tripulados, popularmente chamados de drones, não são novidade em campos de batalha e conflitos no mundo contemporâneo. Entretanto, com o avanço vertiginoso da tecnologia, essas aeronaves vêm ganhando mais capacidade de armazenar munições, de ataques mais precisos e mortais e algumas estão se tornando até autônomas.

Além de preservar o combatente humano, gerar mais economia e agir de forma rápida e eficaz, os drones modificaram radicalmente o cenário de conflitos, afirmou a advogada, doutoranda e mestre em ciências aeroespaciais pela Universidade da Força Aérea (Unifa) Carla Michel, em conversa com a Sputnik Brasil, no programa Mundioka.

“Modificou em demasia o planejamento de guerra, mudou muito o planejamento de ações de defesa de conflitos reais”, opinou ela.

A advogada, que também integra a Comissão de Direito Aeronáutico da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de São José dos Campos e Paraibuna, destacou que o conflito entre a Rússia e a Ucrânia pode ser considerado um marco no uso de drones, com “mudanças de paradigma, trazendo itens de avanço, pontos de atenção quanto à utilização dessas aeronaves”.

Também em entrevista para a Sputnik Brasil, o professor de ciências aeroespaciais da Unifa e coronel da Reserva da Força Aérea Brasileira Eduardo Valle sinalizou que existem diferentes tipos de drones, aplicações variadas, custos e efeitos diversos.

“Nessa categoria de drones militares, há diferentes tipos de funcionalidade e até mesmo de tipo de drone. Tem o drone muito pequeno, que ficou popularizado agora na guerra entre a Rússia e a Ucrânia, mas há também drones muito grandes, que são semelhantes aos aviões convencionais”, explicou.

Alguns soltam bombas, outros explodem ao chegar ao objetivo, há ainda os kamikaze, que são a própria bomba, os que apenas mapeiam, entre outros, elencou Valle, que também é doutor em geografia e mestre em ciências aeroespaciais.

“Os drones menores, de uso comercial e que foram adaptados para o uso no combate, são drones que improvisam dispositivos explosivos no corpo, na sua estrutura, e fazem uso desse explosivo em determinado setor do campo de batalha, muitas vezes atingindo até efeitos significativos, como, por exemplo, destruir um carro de combate ou até mesmo uma peça de artilharia”, explicou.

Já os maiores têm capacidades muito mais ampliadas, com bombas de precisão, mísseis, foguetes com maior carga explosiva.

Justamente por ser um vetor com poder multifacetado, altamente eficaz e letal, Michel alertou que é vital haver uma legislação segura internacional para esse tipo de arma, tendo os direitos humanos como uma das premissas:

“Em um conflito armado é preciso ter como pauta as regras de Direito Internacional Humanitário, que são regras mais voltadas para a guerra propriamente dita, de direitos humanos, que são normas basilares. O drone tem uma alta capacidade, mas também a gente tem que verificar toda a necessidade de normatização em torno desse vetor, que nos dê amparo até para atuação e também para preservação de vidas”, argumentou.

O militar lembrou que o uso de drones em campos de batalha não é recente e citou a guerra do Vietnã como exemplo. Lembrou ainda que esse tipo de veículo ganhou popularidade a partir das campanhas dos EUA e aliados depois do atentado em 11 de setembro de 2001, quando começaram a utilizar drones militares de maior porte contra lideranças de grupos insurgentes e terroristas.

Segundo ele, até então os drones se enquadravam nas leis e no direito da guerra já existentes, quando no campo de batalha, pois se assemelhavam a peças de artilharia ou a um avião. Com as novas tecnologias, isso mudou:

“A questão que está em torno do drone é a questão da autonomia. E aí a gente é levado para o tema da inteligência artificial. Que permite que o drone tenha reflexos ou tenha reações que algoritmos embarcados vão permitir que ele parta para a ação em função de determinada ameaça ou de determinado comportamento do adversário”.

Inteligência Artificial: faca de dois gumes

Alguns drones com uso de inteligência artificial (IA) dispõem de um dispositivo que compara as informações que obtém de um sensor ótico com as informações que tem na memória embarcada dentro do próprio míssil ou do próprio drone, descreveu.

“Ele vai navegando ao longo da sua trajetória, reconhecendo o terreno e quando se aproxima daquilo que entende que é o alvo, ele compara, por exemplo, o formato arquitetônico da engenharia daquele alvo, a estrutura daquele alvo com os dados embarcados que possui e aí decide sobre o direcionamento desse míssil na direção do objetivo militar”.

Valle salientou que essa é uma das principais discussões envolvendo drones atualmente, inclusive no âmbito da Organização das Nações Unidas (ONU):

“Quando o drone é lançado e perde a comunicação propositalmente ou não com o ser humano que está por trás da sua operação, ele passa a ter um comportamento autônomo. E aí é que surgem as grandes discussões em torno da responsabilização, da questão da ética, da questão da transparência no uso dessas tecnologias que são genericamente caracterizadas como drones”.

Os chamados danos colaterais, quando ataques ocasionam em mortes de civis, em geral, ocorrem devido a erro de inteligência em que a informação sobre o alvo foi mal interpretada, mal obtida e/ou negligenciada pelo operador do drone, frisou ele.

“Se você não tem uma boa inteligência, uma boa capacidade de obter informações sobre onde estão os alvos, os alvos de natureza militar obviamente, não os alvos aleatórios, você correrá certamente o risco de transgredir algum preceito, algum princípio, alguma norma do direito da guerra”.

Michel ponderou que essa tecnologia traz muitas possibilidades, mas também ressalvas, e deve ser utilizada com cautela:

“Cautela de cunho humano e também de um cabedal jurídico irrefutável, de segurança jurídica que garanta itens de responsabilidade, itens de verificação de que cada ator naquela cadeia de atuação é responsável”, defendeu.

Logo, uma das definições prementes por parte das leis, pontuou a especialista, diz respeito aos limites da autonomia da inteligência artificial em combate e garantir que decisões críticas fiquem sob controle humano, organizadas as responsabilidades, as atuações de cada um, a fim de preservar vidas.

O Brasil e os drones

O Brasil tem tido grandes avanços em relação aos drones, segundo os entrevistados, com empresas privadas nacionais desenvolvendo projetos e produções, além de inúmeras pesquisas acadêmicas, não apenas na área militar como também em outras atividades, como agricultura, de monitoramento e entregas urbanas.

“As universidades estão cada vez mais se debruçando sobre esse vetor, sobre a importância desse vetor em relação a diversas áreas, mas eu destaco aqui a atuação desse vetor na área de defesa”, comentou Michel.

Valle acrescentou que, por ora, a Força Aérea brasileira tem utilizado drones de origem israelense, sobretudo, para vigilância, reconhecimento com imagens para fornecer dados sobre crimes transfronteiriços, queimadas, entre outras. Mas há outras alternativas no horizonte.

“No campo militar, o Brasil tem algumas empresas que produzem drones. E, ultimamente, a gente tem ouvido falar muito da Exmobots, que é uma fábrica brasileira que fica em São Paulo, da Stela, que também é uma outra empresa que produz drones no Brasil. Inclusive, a Exmobots está fornecendo drones para o Exército Brasileiro e a Stela está com uma espécie de pré-contrato ou de uma pré-negociação com a Marinha para fornecer também drones”.

Nesse sentido, a advogada salientou a importância da sociedade civil para participar do debate, ao lado do governo e do setor privado, a fim de garantir questões como sustentabilidade e políticas públicas na utilização de drones na defesa e em outras áreas, como segurança pública, meio ambiente e serviços.

FOTO: © Sputnik / Aleksey Nikolskyi

FONTE: https://telegra.ph/N%C3%A3o-se-faz-mais-guerra-como-antigamente-drones-com-IA-mudaram-radicalmente-disputa-entre-pa%C3%ADses-09-03