Rico em recursos naturais, o Ártico é frequentemente chamado de “segundo Oriente Médio” e abriga 13% das reservas mundiais de petróleo ainda não exploradas.
A autora viajou para a Islândia em 15 de outubro para participar da conferência anual Círculo Ártico e colaborou na organização e condução de uma mesa-redonda intitulada “As relações da China com o Ártico: competição estratégica e cooperação prática”.
Vale destacar que este foi o único fórum, na edição deste ano da conferência, que reuniu estudiosos da China, Europa, Rússia e Estados Unidos. O evento foi coorganizado pelo Instituto de Estudos Chineses e Americanos (ICAS), dos Estados Unidos, e pelo Clube de Pequim para o Diálogo Internacional, da China.
Uma acadêmica russa, vinda de Moscou, lamentou que a viagem — que antes levava apenas quatro horas — desta vez tenha durado trinta. “Todos nós sabemos o motivo”, disse ela. Isso talvez simbolize que, no atual clima internacional, o caminho para o “diálogo” parece mais longo do que nunca, mas ainda assim vale a pena ser trilhado.
O desafio da estabilidade e da cooperação no Ártico
O tema central da mesa-redonda foi como manter a paz e a estabilidade na ordem ártica e promover o uso pacífico dos recursos polares em meio à crescente competição entre grandes potências. Muitos participantes expressaram preocupação com questões como: qual papel a China desempenhará no Ártico? A política ártica chinesa é consistente e estável? Por trás dessas dúvidas está a busca prática por “encontrar certeza em meio à incerteza”.
Vista do alto, a Islândia se assemelha a uma tigela invertida e irregular — com mais de uma centena de vulcões e vastas geleiras espalhadas pela ilha. Essa geografia peculiar parece lembrar os políticos de que os vulcões podem entrar em erupção a qualquer momento e que, sob as geleiras, há tesouros tentadores. Mas, se a humanidade se deixar cegar pela ganância e pela competição, corre o risco de quebrar essa frágil e preciosa “tigela de arroz dourada”.
O valor estratégico do Ártico
Rico em recursos naturais, o Ártico é frequentemente chamado de “segundo Oriente Médio”. Segundo o Serviço Geológico dos Estados Unidos (USGS), a região abriga 13% das reservas mundiais de petróleo ainda não exploradas (cerca de 100 bilhões de barris) e 30% das reservas de gás natural (cerca de 50 trilhões de metros cúbicos). A camada de gelo da Groenlândia contém 7% da água doce do planeta.
Com o aquecimento global e os avanços tecnológicos em quebra-gelos, o valor estratégico das rotas marítimas do Ártico vem crescendo rapidamente.
No entanto, as mudanças geopolíticas tornam o futuro da região mais incerto. Rússia, Estados Unidos, China e países europeus reforçam suas políticas de exploração de recursos e proteção ambiental, mas cada um possui interesses e preocupações distintos quanto à ordem regional e à divisão de benefícios.
A posição estratégica do Ártico está intimamente ligada à segurança nacional, e a defesa chinesa de um conceito de “segurança universal” ainda não é plenamente reconhecida por alguns países, o que torna inevitável a competição militar.
Governança e disputas
Do ponto de vista da governança, o Conselho do Ártico tem desempenhado um papel positivo no monitoramento climático, na proteção ambiental e no desenvolvimento sustentável dos povos indígenas. No entanto, ele não se baseia em um tratado internacional e possui força legal limitada.
Além disso, alguns países — movidos por interesses próprios — restringem a participação de outros, o que gera falta de equidade e autoridade na governança ártica.
Na ausência de um mecanismo institucional garantido pelas Nações Unidas, crescem as disputas por recursos e a presença militar, evidenciadas pelos inúmeros exercícios militares polares realizados nos últimos anos.
Anteriormente, Donald Trump chegou a propor “comprar a Groenlândia” e intensificou a competição estratégica por meio de guerras comerciais e restrições de rotas, o que sem dúvida acrescentou uma nova camada de frieza política ao gelo do Ártico.
Um caminho para o diálogo e a confiança
Diante desse cenário, preservar a paz e a cooperação no Ártico tornou-se uma tarefa urgente.
Como observadora oficial do Conselho do Ártico, a China tem defendido de forma consistente uma governança polar aberta, cooperativa e sustentável.
Com o Conselho atualmente em um estado de semi-paralisia devido à crise ucraniana, é essencial fortalecer a comunicação multilateral e explorar novos mecanismos de coordenação.
Talvez o caminho ideal seja criar um órgão de coordenação ártica sob o sistema das Nações Unidas.
Até que isso aconteça, as grandes potências devem reforçar a confiança mútua e o diálogo, integrando os assuntos do Ártico em um marco internacional estável, seguro e igualitário.
Espera-se que esta conferência na Islândia se torne de fato uma “Conferência da Tigela de Ouro” — refletindo a beleza do gelo e da neve do Ártico, mas também ajudando a “espantar o frio e aquecer” a cooperação internacional pela paz e sustentabilidade na região.
Foto: Beijing Club
FONTE: https://www.brasil247.com/blog/o-artico-e-uma-tigela-de-arroz-dourada