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Prisão do banqueiro “ostentação” do Master explode pacto de silêncio no Congresso

A prisão do banqueiro e a liquidação do Master revelam relações espúrias de finanças com o Congresso Nacional.

Há escândalos que chegam como rachaduras discretas; outros entram em cena como portas arrombadas. A derrocada do Banco Master pertence à segunda categoria — não apenas por sua dimensão financeira, mas pela revelação brutal de uma engrenagem político-econômica que funcionou por meses sob a proteção de gabinetes, alianças e interesses bem distribuídos.

A prisão de Daniel Vorcaro nesta terça-feira, 18 de novembro de 2025, é a queda do biombo: atrás dele, expõe-se um sistema inteiro. Nada para em pé e a lama chega até o pescoço.

A operação que levou a Polícia Federal ao Aeroporto de Guarulhos, onde Vorcaro embarcava rumo a Dubai, não investigava meros deslizes contábeis. A Operação Compliance Zero identificou um esquema multibilionário de títulos sem lastro, carteiras “insubsistentes” e circuitos de crédito simulados para ludibriar fiscalização.

O Banco Central — que descreveu o Master como instituição em “grave crise de liquidez” e com “violações severas às normas do sistema financeiro” — decretou a liquidação extrajudicial poucas horas depois.

A implosão de um banco não poderia ser mais simbólica: ela veio no mesmo dia em que políticos que o defenderam por meses tratavam de se proteger do incêndio.

O cálculo era simples: o Banco Master captou bilhões oferecendo CDBs de até 130%–140% do CDI, investiu em empresas com problemas severos e se alavancou em proporções que bancos prudentes jamais admitiriam — chegando a multiplicar por dez cada real de capital próprio. O rombo potencial beira 12,2 bilhões de reais, valor bloqueado pela PF. Mais de 1,6 milhão de investidores podem ser afetados. Tudo isso sob a sombra confortável do Fundo Garantidor de Créditos, que blindava o banco enquanto atraía depositantes com promessas de rentabilidade milagrosa.

Por que esse modelo arriscado continuou tolerado?

Por que o Banco Central, ainda sob Roberto Campos Neto, não interveio antes, quando já existia clara deterioração dos ativos?

E por que a decisão final só veio na gestão de Gabriel Galípolo, justamente no dia da prisão do controlador?

Neste desmoronamento, surge uma peça-chave: o BRB — Banco de Brasília. Em março, o conselho do BRB aprovou a compra de 58% do Banco Master, numa operação de R$ 2 bilhões, que transformaria o banco público do DF num escudo para o Master. O governador Ibaneis Rocha celebrou o negócio, dizendo que o BRB “daria um salto nacional” e que salvar o Master seria “garantir estabilidade ao sistema”. A narrativa não resistiu a setembro, quando o BC vetou a compra. Mas antes disso, muitos alertas já haviam sido dados por sindicatos, auditores e analistas.

Por que um banco público menor deveria comprar um banco privado maior, mais arriscado e envolvido em denúncias crescentes?

Quais pareceres técnicos sustentaram decisão tão temerária?

Havia interesses políticos ocultos em jogo?

Quem, dentro do BRB e do governo do DF, garantiu que o Master era sólido quando já não era?

No Senado, uma CPI sobre a compra do Master pelo BRB estava pronta para nascer. O autor do requerimento, Izalci Lucas, dizia buscar transparência. Tinha assinaturas suficientes. De repente, duas desapareceram — Carlos Viana e Cleitinho — ambos de Minas Gerais, estado natal de Vorcaro. A CPI morreu antes de respirar.

Foi nesse ponto da narrativa — quando Brasília parecia disposta a silenciar — que surgiu a primeira fissura no pacto: o anúncio de que deputados do Distrito Federal preparavam uma reação própria. A notícia correu hoje cedo pelos corredores da CLDF: havia movimentação para um requerimento de CPI local. Apenas rumores, até então.

E então veio o documento.

No início da tarde, o deputado Chico Vigilante, acompanhado por Fábio Felix e por parlamentares do PT, PSOL, PSB e outros blocos, protocolou na CLDF um requerimento formal para criação de uma CPI destinada a investigar a tentativa de compra do Banco Master pelo BRB. O texto pede investigação das negociações bilionárias, suspeitas de gestão fraudulenta, possível uso indevido de recursos públicos para salvar instituição privada, ingerência política, favorecimento indevido e denúncias internas envolvendo auditorias como EY e PwC, incluindo o “Projeto Luna”.

Esse requerimento, ao contrário das manobras do Senado, não recua. Ele escancara tudo: Você usou recursos públicos para salvar um banco privado? Quem autorizou isso? Quem intermediou? Que contratos foram assinados às pressas? Quais líderes partidários influenciaram decisões técnicas do BRB? Por que pareceres da EY e da PwC foram ignorados? Quem participou do “Projeto Luna”? Quais reuniões ocorreram entre BRB, Master e governo do DF antes da liquidação? Havia ingerência direta do Palácio do Buriti? Que vantagens políticas seriam geradas com a operação?

Enquanto o escândalo se expande, o rombo econômico já se manifesta no cotidiano: investidores buscando o FGC; filas digitais para verificar ressarcimentos; servidores do BRB alarmados; auditores revirando contratos; a praça dos Três Poderes murmurando nomes antes intocáveis.

A implosão do Master não é uma história de um banqueiro audacioso — é a história de uma arquitetura de poder construída com conivência, arrogância e silêncio institucional.

No fim, o episódio é como ver uma grande barragem se romper: durante anos, autoridades garantiram que tudo estava sob controle, que a estrutura era segura. Mas a água — a verdade — já pressionava as paredes.

Quando a primeira fissura surgiu, não havia mais como conter o fluxo. Agora, todos tentam escapar da enxurrada. Mas há um detalhe incômodo: a água sempre leva consigo o que estava escondido no fundo. É um voa barata em Brasília.

FOTO: Reprodução

FONTE: https://www.brasil247.com/blog/prisao-do-banqueiro-ostentacao-do-master-explode-pacto-de-silencio-no-congresso