Rankings globais revelam a decadência ocidental: universidades antes intocáveis assistem ao avanço chinês, que já ocupa oito das dez primeiras posições.
As universidades chinesas acabam de aplicar um golpe silencioso — porém irreversível — no imaginário acadêmico do Ocidente. O ranking Leiden 2024, referência mundial em métricas científicas, trouxe à luz uma realidade que há anos se consolidava nos gráficos, nas curvas de evolução, nos relatórios especializados: entre as dez instituições que mais publicaram pesquisas de impacto entre 2019 e 2022, oito são chinesas. Trata-se de um deslocamento estrutural, não de uma anomalia estatística. O epicentro da produção científica já não está em Boston, Stanford ou Cambridge: está em Hangzhou, Xangai, Wuhan, Guangzhou. Harvard continua como farol histórico; Toronto surge como exceção norte-americana resistente. O restante do Ocidente observa, perplexo, a mudança do eixo do conhecimento enquanto ainda repete diagnósticos formulados no século passado.
Esse ranking não é um episódio isolado: é sintoma de um movimento contínuo, sólido, planejado. Para compreender a magnitude do deslocamento, vale observar as dez universidades mais produtivas do mundo, acompanhadas de características que explicam seu lugar na vanguarda global:
1. Zhejiang University (37.457) – inovação disruptiva aliada a um ecossistema empresarial integrado ao campus, formando um dos ambientes científicos mais férteis do planeta.
2. Harvard University (36.654) – redes acadêmicas globais e forte financiamento privado que sustentam laboratórios de ponta e influência histórica.
3. Shanghai Jiao Tong University (35.373) – potência incontornável em engenharia avançada e geração de patentes industriais.
4. Sichuan University (29.536) – referência em medicina, farmacologia e pesquisa translacional de alta precisão.
5. Central South University (27.615) – liderança em metalurgia moderna e engenharia de materiais estratégicos.
6. Huazhong University of Science and Technology (27.549) – destaque em robótica, computação quântica e inovação aplicada.
7. Sun Yat-sen University (25.858) – excelência consolidada em biotecnologia, ciências da saúde e centros clínicos de referência.
8. University of Toronto (25.439) – prestígio em neurociência, políticas públicas baseadas em evidências e pesquisa interdisciplinar.
9. Xi’an Jiaotong University (24.574) – inovação em sistemas energéticos, engenharia mecânica e tecnologias de infraestrutura avançada.
10. Tsinghua University (24.574) – hub de IA e ciências exatas, conhecida como a “MIT do Oriente”, embora já ultrapasse equivalentes ocidentais em áreas estratégicas.
Essas posições não refletem acaso; refletem escolhas políticas deliberadas. A China tratou universidades como infraestrutura de soberania, não como adornos institucionais. Investiu em laboratórios, formação de quadros, pesquisa dura, atração de talentos globais e integração entre Estado, academia e mercado. Enquanto isso, parte do Ocidente dispersou energia em cortes orçamentários, disputas ideológicas internas e descolamento crescente entre conhecimento e desenvolvimento nacional. A China avançou com método, continuidade e ambição — e o resultado está exposto no ranking.
Esse movimento, inevitável para quem lê dados sem vieses, foi reconhecido por algumas das vozes mais lúcidas e influentes do próprio Ocidente. O Nobel de Economia Joseph Stiglitz afirmou que “a China se tornou uma das economias mais inovadoras do mundo” e que seu investimento em ciência, tecnologia e educação “está remodelando a fronteira global do conhecimento”. Stiglitz não fala por entusiasmo, mas por observação histórica: identifica que a China não adota inovação como palavra de efeito, e sim como estratégia de longo prazo.
No mundo da tecnologia, Eric Schmidt, ex-CEO do Google e autoridade global em IA, reforçou o alerta ao afirmar que “a China está prestes a ultrapassar os Estados Unidos em inteligência artificial” e que possui “mais engenheiros, mais dados e mais ambição política” para dominar a área. Schmidt lê o avanço chinês não como acidente, mas como consequência de recursos estruturais que os EUA já não monopolizam.
Até no núcleo do establishment diplomático a percepção mudou. O falecido Henry Kissinger, em uma de suas últimas entrevistas, afirmou que “a China alcançou um nível de desenvolvimento tecnológico que poucos no Ocidente previram” e que sua capacidade de inovação “deve ser levada extremamente a sério”. Vindo de Kissinger — arquiteto da reaproximação sino-americana e crítico obsessivo de improvisações estratégicas — a frase soa como um obituário da antiga crença no predomínio incontornável do Ocidente.
Na Europa, a análise converge. Klaus Schwab, fundador do Fórum Econômico Mundial, declarou que “a China tornou-se líder global em inovação tecnológica e científica” e que seu modelo de investimento em pesquisa “é hoje um dos mais eficazes do mundo”. Para Schwab, o avanço chinês não é episódio isolado: é realinhamento estrutural da economia do conhecimento.
Essas quatro declarações, vindas de polos distintos de autoridade intelectual, ajudam a contextualizar o que o ranking Leiden revela: não se trata apenas de mudança quantitativa, mas de mudança de estrutura mental. E é nesse ponto que uma transição lógica se impõe: para entender o presente, é preciso desmontar os três preconceitos centrais que moldaram a forma como o Ocidente interpretou — e distorceu — o avanço científico da China ao longo das últimas décadas.
Durante muito tempo, esses preconceitos funcionaram como muletas psicológicas, dispositivos de defesa cognitiva, artifícios narrativos para manter viva a ilusão da superioridade permanente. Eles permitiam ao Ocidente olhar para a China sem realmente vê-la. Hoje, a realidade demoliu essas muletas.
O primeiro preconceito, o mais antigo e infantil, dizia que “a China copia”. Era um mantra confortável, quase terapêutico: se copia, não ameaça; se imita, não cria. Mas a verdade empírica revela outra coisa. Relatórios da Clarivate e da Nature mostram que a produção científica chinesa cresceu em velocidade até cinco vezes superior à dos EUA. A ONU registrou que a China produziu, entre 2014 e 2023, 38 mil patentes em IA generativa, contra 6.276 dos EUA. Quem copia não lidera revoluções tecnológicas — quem copia não registra patentes que moldam o século XXI.
O segundo preconceito, mais sofisticado, afirmava que “produzem muito, mas sem qualidade”. Tentava transformar quantidade em argumento de desvalorização. Mas os dados destroem essa narrativa. A China ultrapassou os EUA em artigos citáveis, lidera publicações altamente citadas e domina áreas de fronteira como energia renovável, nanotecnologia, supercondutividade e engenharia biomédica. Qualidade científica não é opinião: é impacto mensurável — e o impacto chinês é incontornável.
O terceiro preconceito, impregnado de arrogância cultural, dizia que “falta originalidade”. Esse mito prosperou porque servia de conforto ideológico. Mas estudos publicados na ScienceDirect mostram que a China apresenta crescimento acelerado em artigos classificados como novidade conceitual. O relatório da ONU sobre IA generativa revela que 85% dos avanços disruptivos da última década têm participação direta ou indireta de pesquisadores chineses. O Ocidente dizia que a China “fabricava”. A China fabricou o futuro. O Ocidente dizia que a China “não concebia”. A China concebeu novos paradigmas de IA, química avançada e computação quântica. O Ocidente dizia que a China “jamais lideraria”. A China lidera — sem pedir autorização.
O mais irônico é que todo esse avanço ocorreu sem fanfarra. Enquanto o Ocidente aperfeiçoava narrativas, a China aperfeiçoava laboratórios. Enquanto se discutiam identidades, eles discutiam semiconductores. Enquanto se evocava nostalgia, eles evocavam futuro. Não houve autopromoção, teatro ou messianismo — houve método.
O ranking Leiden 2024 não é apenas uma fotografia estatística: é o retrato de uma mudança de época. É a certidão de óbito das velhas certezas do Ocidente e o testemunho da ascensão de uma nova geopolítica do conhecimento — mais plural, mais assimétrica, mais surpreendente para quem acreditou que a história havia se aposentado.
E, como sempre, resta a frase que resume com precisão o que está diante de nós: nada vem por acaso. A China colhe exatamente aquilo que decidiu plantar. O Ocidente tenta, agora, correr atrás da própria sombra — com atraso, com espanto e com a sensação súbita de que o século XXI começou sem consultá-lo.
Foto: Mídia chinesa
FONTE: https://www.brasil247.com/blog/revolucao-silenciosa-das-universidades-chinesas-humilha-velha-elite-ocidental