O novo ciclo de Trump acelera choques institucionais, guerras comerciais e a erosão da própria hegemonia dos EUA.
Trump governa pelo choque — tarifas, sanções, desmonte burocrático, captura corporativa — e com isso inaugura uma era aceleracionista na prática, mesmo sem assumir o rótulo. Mas para onde estamos sendo levados? À sobrevivência da hegemonia americana ou à sua implosão? O mundo inteiro está preso a essa roleta de aceleração e fricção.
Introdução — O método da aceleração
Trump não governa por etapas, negociações ou pactos graduais. Ele governa pelo choque. Cada decreto, cada tarifa, cada ameaça de sanção não é apenas uma política — é uma ruptura calculada, uma martelada que desestabiliza o presente para abrir espaço a outro arranjo, mais instável, mais rápido, mais caótico. Esse é o coração do aceleracionismo: empurrar o sistema além de seus freios, romper amortecedores institucionais e testar os limites do próprio colapso como se a crise fosse combustível.
A ideia não nasce com Trump. O aceleracionismo, enquanto conceito, sempre oscilou entre duas vertentes: uma de esquerda, que acreditava na possibilidade de usar as engrenagens do capitalismo e da tecnologia para criar novos horizontes emancipatórios; e outra de direita, que via no colapso das instituições democráticas uma chance de consolidar novas formas de poder autoritário, tecnológico e corporativo. O que Trump faz é transformar essa intuição em método de governo, sem precisar nomeá-la.
A lógica é simples e devastadora: acelerar tensões internas, tarifar aliados e rivais indistintamente, corroer a burocracia técnica, privatizar funções do Estado, chacoalhar acordos multilaterais. Tudo isso gera atrito, e o atrito gera velocidade. Mas velocidade para onde? Para uma hegemonia americana reforçada ou para a implosão da própria ordem construída pelos Estados Unidos no pós-guerra?
Ao olharmos o conjunto das ações do trumpismo em 2025, a resposta não está clara — e é justamente isso que torna o momento histórico. Trump não administra: ele acelera. O mundo inteiro, inclusive o Brasil, está preso dentro dessa roleta, onde cada giro pode significar uma reconfiguração drástica do tabuleiro global.
O Conceito de Aceleracionismo — Da teoria ao campo político
O aceleracionismo nasceu como uma provocação filosófica e se transformou numa lente para compreender as crises do presente. O termo, cunhado de forma crítica por Benjamin Noys em 2010, descrevia correntes que defendiam levar as contradições do capitalismo ao limite para precipitar sua superação. Mas rapidamente o conceito saiu da teoria e se espalhou em direções opostas, ora emancipadoras, ora destrutivas.
De um lado, a vertente de esquerda (Nick Srnicek e Alex Williams) via no aceleracionismo uma estratégia de apropriação das infraestruturas do capital — ciência, tecnologia, planejamento algorítmico — para reorganizar a economia de forma democrática e pós-capitalista. Em vez de recuar para o localismo e a política de pequenos gestos, propunham enfrentar o capitalismo com suas próprias armas, mas sob controle popular.
Do outro, a vertente de direita e neorreacionária (Nick Land e a escola CCRU) transformou o aceleracionismo numa celebração da desregulação absoluta, da erosão de direitos e da submissão total ao tecnocapital. Para esse campo, acelerar significa destruir freios democráticos, dissolver Estados e entregar o destino da sociedade às engrenagens do mercado e da tecnologia, mesmo que isso custe vidas, coesão social e estabilidade política.
Entre essas duas margens surgiu ainda o aceleracionismo tecnológico do Vale do Silício (e/acc): um hibridismo que prega o crescimento irrestrito da inteligência artificial, da biotecnologia e da infraestrutura digital sob o lema de que “o futuro precisa chegar mais rápido”. Manifestos como o de Marc Andreessen, em 2023, assumem abertamente o termo “aceleracionismo” e o transformam em bandeira de legitimação empresarial.
E há ainda um quarto campo, obscuro e perigoso: o aceleracionismo extremista violento, que inspira grupos neonazistas e supremacistas a provocar deliberadamente o colapso social por meio de ataques, sabotagens e terrorismo, acreditando que o caos abrirá caminho para uma nova ordem racial. Esse é o ponto em que o conceito sai da filosofia e entra nos relatórios de segurança nacional dos EUA como ameaça terrorista doméstica.
Trump não se encaixa em nenhuma dessas categorias de forma pura. Ele não escreve manifestos, nem teoriza futuros. Mas sua prática de governo ecoa elementos de todas essas vertentes: a destruição institucional dos neorreacionários, o entusiasmo empresarial dos e/acc, e até a abertura de espaços para que extremistas domésticos se fortaleçam no vácuo do caos. É por isso que, mais do que discutir se Trump é “aceleracionista” em sentido estrito, o que importa é perceber que ele governa acelerando — e os efeitos disso são globais, irreversíveis e potencialmente catastróficos.
A Crise Interna dos EUA — O motor oculto
O aceleracionismo trumpista não nasce apenas de uma escolha tática: ele se alimenta de uma crise interna profunda que corrói os alicerces dos Estados Unidos. Por trás da retórica de grandeza e poder, o país enfrenta uma polarização social inédita desde a Guerra Civil, uma erosão da confiança nas instituições e uma economia que, embora ainda robusta em termos absolutos, já não garante coesão interna nem estabilidade política.
O Project 2025 e a reintrodução do Schedule F são as ferramentas mais visíveis dessa lógica. Trata-se de uma operação cirúrgica para desmontar o serviço público profissional, substituindo técnicos por leais ideológicos. Na prática, é a aceleração de uma guerra contra a burocracia estatal: eliminar amortecedores institucionais que, por décadas, seguraram a máquina administrativa contra oscilações partidárias. O objetivo é claro: permitir que o Executivo concentre poder e imponha mudanças sem resistência, transformando cada agência em trincheira política.
Essa reconfiguração administrativa se soma à captura corporativa: Palantir nos sistemas de vigilância, SpaceX no espaço e na infraestrutura de conectividade, Big Techs no controle de nuvem e dados governamentais. O Estado terceiriza suas funções críticas para empresas que, ao mesmo tempo, são atores políticos e econômicos globais. O que deveria ser soberania estatal transforma-se em dependência de contratos privados — e isso não é acidente, mas parte da lógica aceleracionista: desmontar o Estado por dentro para reconstruí-lo como máquina de choque.
Mas a crise interna vai além da engenharia institucional. O país está intoxicado por uma polarização cultural radicalizada, alimentada por redes sociais e amplificada por líderes que lucram com a fratura permanente. O discurso de “inimigos internos”, “deep state” e “traidores” não é retórica vazia: é uma arma psicológica que mina a confiança do cidadão em qualquer instância que não seja a liderança carismática de Trump. É aqui que a guerra cultural, a desinformação e o lawfare se tornam engrenagens inseparáveis do projeto acelerador.
A economia, por sua vez, opera em contradição: o dólar ainda reina e Wall Street continua central, mas o custo social é crescente. O país vive bolhas tecnológicas, desigualdade brutal e precarização do trabalho. Essa fratura social é combustível: um povo em crise, dividido e desconfiado, é o terreno perfeito para políticas de choque.
Assim, a crise interna dos EUA não é apenas um problema doméstico. Ela é o motor oculto de uma estratégia que exporta instabilidade, usa o caos como instrumento de poder e coloca em risco tanto a ordem interna quanto a global. A aceleração começa dentro de casa, mas suas ondas de choque reverberam em todo o planeta.
O Choque Global — Tarifas, sanções e desordem estratégica
Se dentro dos EUA o aceleracionismo se expressa no desmonte burocrático e na guerra cultural, fora das fronteiras ele se manifesta como uma ofensiva caótica contra o próprio sistema internacional. Trump governa o comércio e a diplomacia com a lógica da fricção permanente: tarifas lançadas de surpresa, sanções seletivas, suspensão de vistos, ameaças militares e renegociações incessantes de acordos. Cada gesto é uma ruptura que reordena relações de poder.
A tarifização sistêmica de 2025 é exemplo paradigmático. Ao taxar exportações brasileiras em até 50% e mirar setores inteiros da Europa e do Japão, Trump não age apenas para proteger a indústria americana: ele acelera a fragmentação do comércio global. As cadeias de valor são forçadas a se reconfigurar em tempo recorde, empresas correm para criar rotas alternativas e países buscam arranjos paralelos com China, BRICS e moedas alternativas. O efeito não é proteção, mas instabilidade crônica.
Do mesmo modo, a política de sanções personalizadas amplia a desordem. Ao atingir ministros do STF no Brasil ou restringir vistos de diplomatas, o governo Trump inaugura uma diplomacia de guerra psicológica: não se trata apenas de economia, mas de humilhação simbólica e corrosão institucional nos países-alvo. A mensagem é clara — os EUA podem transformar o passaporte em arma e a economia em campo de batalha a qualquer instante.
Essa lógica do choque global tem um paradoxo central: ao tentar reafirmar a hegemonia americana pela força, Trump acelera a erosão da ordem liberal que sustentou essa hegemonia. Cada tarifa unilateral incentiva parceiros a buscar alternativas regionais; cada sanção injustificada empurra países a criar sistemas paralelos de pagamento; cada humilhação diplomática fortalece coalizões que antes eram dispersas. A tentativa de reafirmar poder gera justamente o contrário: um mundo multipolar mais rápido do que o previsto.
O resultado é um planeta tarifado, litigioso e fragmentado. A economia global se move em blocos, os organismos multilaterais perdem relevância e as regras do jogo viram moeda de barganha a cada crise. O comércio desacelera, a confiança evapora e a geopolítica entra em estado de combustão permanente. É um método de governança baseado no curto-prazo, mas com impactos de longo alcance — um aceleracionismo diplomático que coloca o mundo inteiro em marcha forçada rumo ao caos.
A Dimensão Tecnológica — O e/acc e a privatização da soberania
No coração do aceleracionismo contemporâneo está a tecnologia. Não apenas como ferramenta, mas como ideologia. O Vale do Silício abraçou a vertente chamada e/acc (effective accelerationism), que prega a expansão irrestrita da inteligência artificial, da biotecnologia e da infraestrutura digital sob a crença de que qualquer freio regulatório é atraso civilizatório. É a utopia do futuro mais rápido, pouco importando os custos sociais ou políticos.
Trump não formula manifestos nesse campo, mas sua aliança com figuras como Elon Musk, Peter Thiel e os barões da Big Tech cria uma afinidade eletiva: menos regulação, mais experimentação, mais poder para empresas que já controlam dados, nuvens, satélites e sistemas de vigilância. O aceleracionismo, aqui, se traduz em um Estado que terceiriza soberania e entrega funções críticas a conglomerados privados que não respondem a parlamentos, mas a acionistas.
A Palantir fornece softwares de análise para inteligência militar; a SpaceX/Starlink controla redes vitais de comunicação; AWS e Microsoft hospedam dados sensíveis do governo. A linha que separa infraestrutura pública de infraestrutura privada se dissolve. Essa simbiose é perigosa: quando o Estado depende estruturalmente de fornecedores, eles passam a definir os limites da ação estatal. Soberania vira contrato.
Essa aceleração tecnológica também reforça desigualdades. Enquanto empresas correm para colonizar setores inteiros com IA e biotecnologia, comunidades ficam cada vez mais expostas à automação predatória, ao desemprego estrutural e ao controle algorítmico da vida cotidiana. No plano internacional, países fora do núcleo tecnológico tornam-se reféns de patentes, licenças e plataformas, incapazes de definir seus próprios rumos digitais.
O aceleracionismo tecnológico não é neutro: ele acelera a concentração de poder e a dependência sistêmica. Ao aderir a essa lógica, Trump reforça um projeto de privatização da soberania norte-americana e, ao mesmo tempo, exporta um modelo que ameaça a autonomia de nações inteiras. O que está em jogo não é apenas velocidade, mas o controle do próprio futuro — quem programa, governa; quem não programa, obedece.
O Risco do Aceleracionismo Extremista
Há uma face do aceleracionismo que não aparece em discursos oficiais nem em documentos de think tanks, mas que cresce nas sombras: o aceleracionismo extremista violento. Essa corrente, difundida em fóruns digitais e células clandestinas, defende o colapso deliberado da sociedade por meio do caos, do terrorismo e da guerra racial. O objetivo não é governar o presente, mas destruir o tecido social para instaurar uma ordem autoritária, etnicamente homogênea e militarizada.
Para esses grupos, cada crise é oportunidade. A inflação, o desemprego, os atentados, os conflitos raciais e a polarização política não são problemas: são ferramentas. Quanto mais instável a sociedade, maior a chance de instaurar uma ruptura radical. Esse pensamento já inspirou atentados nos EUA e na Europa, e hoje aparece em relatórios do Departamento de Segurança Interna como uma das maiores ameaças terroristas domésticas.
Trump não controla diretamente esses movimentos, mas a sua forma de governar pelo choque cria um ecossistema perfeito para que eles prosperem. A deslegitimação das instituições, o discurso de inimigos internos e a normalização da violência política oferecem solo fértil para que extremistas interpretem a conjuntura como sinal de que “a aceleração já começou”. O risco não é que o governo adote oficialmente essa agenda, mas que a convergência entre caos político e radicalização social alimente uma espiral fora de controle.
Esse aceleracionismo violento não mira apenas a destruição do Estado americano, mas também a implosão de qualquer projeto de democracia liberal no Ocidente. Ele se conecta em redes transnacionais, dialoga com supremacistas europeus, com milícias digitais e com setores militares radicalizados. O perigo é que, sob o ruído das políticas oficiais de Trump, essas forças encontrem espaço para agir, sabotando infraestruturas, semeando medo e aprofundando a crise.
Assim, o aceleracionismo extremista funciona como sombra do aceleracionismo governamental: enquanto Trump acelera pela via institucional e econômica, grupos violentos aceleram pela via do terror e do colapso social. A conjunção dessas forças pode empurrar os EUA — e por extensão o mundo — para uma era em que a democracia não apenas se fragiliza, mas se torna inviável.
Cenários Preditivos — Para onde estamos acelerando?
O aceleracionismo não é apenas método de governo ou subcultura extremista. É também um padrão histórico de futuro: quando as engrenagens da crise giram sem freio, o resultado é imprevisível, mas pode ser mapeado em cenários. Não se trata de adivinhação, mas de leitura estratégica: quais forças estão em jogo, quais indicadores precisam ser observados e para onde essa velocidade nos conduz.
Cenário 1 — Hegemonia reforçada via choque (baixa probabilidade)
Neste cenário, o método de Trump funciona como prometido. As tarifas forçam aliados a ceder, as sanções dobram adversários, o Schedule F permite controle total sobre o Estado, e a aliança com as Big Techs acelera a competitividade americana em IA, biotecnologia e defesa. O resultado seria um breve ciclo de hegemonia revitalizada, sustentado pela coerção.
Por que é improvável? Porque cada ação de choque gera contrachoque: aliados buscam alternativas, corporações globais diversificam mercados, e a própria sociedade americana resiste. A hegemonia não se expande quando se governa pelo medo; no máximo, se prolonga por instantes.
Cenário 2 — Fragmentação multipolar acelerada (mais provável)
As tarifas e sanções corroem a confiança no sistema internacional, levando países a criar arranjos paralelos: BRICS expandido, moedas alternativas, corredores comerciais independentes. A ordem liberal se torna inviável e dá lugar a blocos econômicos regionalizados, com comércio mais caro e lento. Os EUA ainda mantêm poder, mas compartilham o tabuleiro com China, Rússia e potências emergentes.
Sinais a observar: aumento de acordos bilaterais fora do dólar; fortalecimento de corredores logísticos como a Ferrovia Bioceânica; uso crescente do yuan e de moedas locais em transações energéticas.
Cenário 3 — Implosão interna e retração global (plausível)
A crise interna sai do controle. Polarização, violência política e sabotagens extremistas abalam a coesão nacional. O governo, fragilizado, é forçado a recuar do tabuleiro internacional para conter incêndios domésticos. É o momento em que o aceleracionismo devora o próprio acelerador.
Sinais a observar: escalada de atentados internos; bloqueio judicial ou congressual ao Schedule F; colapso de confiança em eleições e processos institucionais.
Cenário 4 — Desordem prolongada e instabilidade sistêmica (cenário híbrido)
O mais realista: nem hegemonia, nem colapso total. O que se instala é uma era de ruído permanente — tarifas que entram e saem, sanções temporárias, governos caindo em ondas de instabilidade, cadeias globais reorganizadas em velocidade. É um mundo “tarifado, litigioso e fragmentado”, onde não há centro de gravidade claro e a velocidade é permanente.
Sinais a observar: volatilidade contínua nos mercados, organismos multilaterais esvaziados, proliferação de zonas cinzentas de poder (do Oriente Médio à América Latina).
No curto prazo, já estamos deslizando entre os cenários 2 e 4. A cada nova ruptura, o planeta se aproxima de um futuro em que a aceleração não leva à ordem, mas ao caos administrado. O risco maior não é a guerra declarada, mas a instabilidade crônica — e essa instabilidade já está em marcha.
O que isso significa para o Brasil e o Sul Global
Se os EUA aceleram em direção ao caos, o impacto para o Brasil e o Sul Global é direto e devastador. Trump não enxerga aliados, enxerga alvos de barganha. O Brasil já sentiu o golpe em 2025: tarifas de até 50% sobre exportações estratégicas, sanções e restrição de vistos a ministros do STF. O recado é cristalino — a política externa trumpista não distingue parceiros históricos de inimigos declarados, todos estão sujeitos à lógica da coerção imediata.
Isso tem dois efeitos. Primeiro, a erosão da soberania nacional. Quando o comércio é sequestrado por tarifas unilaterais, quando autoridades são humilhadas com sanções políticas e quando a economia depende de plataformas controladas por Big Techs americanas, a margem de manobra do Brasil se reduz drasticamente. A guerra híbrida deixa de ser metáfora e se materializa em instrumentos concretos de pressão.
Segundo, a aceleração multipolar. O Sul Global, pressionado, é empurrado a buscar alternativas. O fortalecimento dos BRICS, a criação de rotas comerciais fora da órbita americana, o uso de moedas locais ou do yuan em transações estratégicas — tudo isso ganha urgência. Cada tarifa de Trump é um convite para que o Brasil olhe para a China, a Rússia, a Índia e a África do Sul não como parceiros eventuais, mas como pilares de sobrevivência estratégica.
No entanto, essa transição não é automática nem isenta de riscos. O Brasil enfrenta dilemas profundos: como construir soberania tecnológica diante da dependência de nuvens e softwares estrangeiros? Como garantir soberania energética quando o petróleo e a Amazônia estão no radar direto das corporações globais? Como defender soberania informacional em um ecossistema digital controlado por empresas alinhadas ao trumpismo e à extrema-direita global?
O aceleracionismo trumpista transforma o Brasil em laboratório e campo de batalha. Aqui se testam as consequências de tarifas punitivas, as estratégias de desinformação, a manipulação digital e a pressão corporativa. O que está em jogo não é apenas o futuro imediato das exportações, mas o lugar do Brasil em um mundo fragmentado. Ou o país constrói arranjos de resistência — soberania informacional, energética e tecnológica — ou será arrastado como satélite periférico de um império em implosão.
O Sul Global como um todo compartilha esse dilema. Entre alinhar-se a um império acelerador que implode suas próprias bases ou investir na construção de alternativas multipolares, o tempo de hesitar acabou. A aceleração não espera.
Conclusão — O preço da aceleração
O que Trump inaugurou em 2025 não é apenas uma nova etapa da política americana, mas um método histórico: governar pela aceleração. O choque se torna regra, a ruptura vira instrumento e a crise deixa de ser algo a evitar para se transformar em combustível. Esse é o ethos do aceleracionismo: correr sem freios, apostando que do caos surgirá um novo equilíbrio.
Mas há um paradoxo brutal. Cada tarifa lançada contra aliados acelera a busca por alternativas; cada sanção arbitrária fragiliza a legitimidade americana; cada desmonte interno alimenta a polarização e dá fôlego a extremistas. O método que pretende salvar a hegemonia pode, na verdade, acelerar a sua implosão.
O preço da aceleração é a instabilidade permanente. É viver em um mundo onde regras comerciais mudam de um dia para o outro, onde governos são desestabilizados por ataques informacionais, onde instituições democráticas se tornam alvo de corrosão interna e externa. É um planeta tarifado, litigioso, saturado de ruído e de insegurança, onde a confiança — motor invisível da economia e da política — se evapora.
Para o Brasil e o Sul Global, isso significa enfrentar uma escolha estratégica: ou se constrói soberania — informacional, tecnológica, energética — ou se aceita o papel de colônia digital e periférica de um império em convulsão. Não se trata de retórica nacionalista, mas de sobrevivência histórica.
Trump talvez não se declare aceleracionista, mas governa como tal. E o mundo, preso nessa roleta de velocidade e fricção, é arrastado junto. A questão que fica é simples e devastadora: estamos acelerando rumo a quê? A um renascimento da hegemonia americana, improvável e curto, ou a uma era de desordem global sem centro? A história dirá. Mas uma certeza já está posta — o preço da aceleração será pago por todos nós.
Artigo publicado originalmente em <código aberto>
Foto: RS/Fotos Públicas
FONTE: https://www.brasil247.com/blog/trump-e-o-aceleracionismo-o-futuro-em-colapso