Associação Brasileira dos Jornalistas

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Um drink pela democracia

A democracia é o que nos garante o futuro.

Esse texto poderia ser uma espécie de carta.

Para o barman, que sempre me atendeu, ou para a Tia do Zap, ambos acham uma injustiça o julgamento do Bolsonaro e têm ojeriza ao Alexandre de Moraes, que consideram até diabólico.

Mas fiquei me lembrando da frase: “…ele não sobe a rampa…”, dita por ambos logo após a eleição. Mas o que significava aquilo? Para Lula não subir a rampa, eles queriam o golpe? Ou seu assassinato? Ou que os extraterrestres impedissem?

As “ideias” que passaram a assumir, com base nas notícias falsas que os fizeram desacreditar na democracia, ainda continuam neles.

Talvez não saibam de uma série de coisas. Talvez não saibam sequer o significado de comunismo que tanto abominam. Que a palavra vem da comunidade. Que toda a ideia surgiu para que as pessoas de uma comunidade vivessem de maneira harmônica, onde os bens de produção, as máquinas e as fábricas servissem a todos, e não somente aos seus donos.

Talvez não saibam que “companheiro” vem daqueles que dividem o mesmo pão.

“Mas comunismo e esquerda não deram certo em lugar nenhum do mundo”, sempre falam. Mas talvez não saibam que, se o mundo hoje tem três potências econômicas — Estados Unidos, China e Rússia —, as duas últimas tiveram revoluções comunistas. Portanto, são dois países em que a revolução deu tão certo que se tornaram potências mundiais.

Mas, e o povo, como vive? Bom, melhor que grande parte do nosso povo, que ainda passa fome, apesar de termos saído do mapa da fome. E os que não passam vivem amontoados nos ônibus para o trabalho, ganhando pouco, lutando para sobreviver.

“Mas veja as porcarias que a China produz.” E não sabem que, desde o iPhone até todos os produtos de qualidade, que se consomem hoje, são fabricados na China. E também produtos populares.

Talvez não saibam que a Rússia perdeu 13 milhões de soldados para vencer o nazismo. Que foi o Exército Vermelho que conseguiu chegar a Berlim e só não prendeu Hitler porque ele se matou. Que foram eles que libertaram os judeus dos campos de concentração. Talvez não saibam.

“Os Estados Unidos são uma potência.” Talvez não saibam que esse grande país, que é a maior das potências no nosso hemisfério, sempre tratou o Brasil e nossos países vizinhos como se fossem dele. Que aqui convenceram nossos militares, depois da guerra contra Hitler (aquela que os comunistas russos ganharam), de que deveriam perseguir os inimigos internos. Que isso gerou o golpe militar em 1964. Que eles ganharam muito dinheiro com isso, com suas empresas. Que ensinaram torturas aos militares. Fizeram até uma escola de tortura. Essas eram terríveis: penduravam as pessoas em “pau de arara”, davam choques elétricos em pênis, vaginas, ânus, usavam ratos, cobras, cachorros. Que, além da tortura, matavam, desapareciam com os corpos e muitos nunca reapareceram.

Talvez não saibam, ou não se lembrem, que um desses monstros torturadores era um coronel chamado Ustra. Que Bolsonaro fez uma homenagem a esse monstro na tribuna do Congresso, no impeachment da Dilma, dedicando seu voto a ele. Que esse monstro torturou a Dilma.

Não sabem?

Não sabem que o golpe que estava nos cartazes dos acampamentos, os pedidos de intervenção do Exército para impedir a posse do Lula, era para que o mesmo Exército pudesse fazer tudo isso novamente? Que Bolsonaro, quando foi depor no STF, convidou Alexandre de Moraes para ser seu vice-presidente em 2026 e disse que quem pedia o AI-5 como golpe “eram os imbecis”?

O barman me disse que Bolsonaro não tentou o golpe. Mas que ele, o barman, queria. O que ele não sabe é que, se eles queriam, é porque receberam todas essas notícias falsas, que os fizeram acreditar que a eleição foi fraudada, que as urnas seriam manipuladas, que os ministros do STF manipulavam a eleição. Nada disso é verdade.

Eles tentaram o golpe. Fizeram de tudo para que ele ocorresse, e os tanques não foram para as ruas porque os militares não quiseram ir. Respeitaram a eleição. Mesmo quebrando o Supremo, o Congresso e a Presidência no dia 8 de janeiro, para causar o caos e forçar os tanques a saírem às ruas, os militares não foram.

A maioria da população brasileira não só votou no presidente eleito, mas também é contra aquela balbúrdia, contra a anistia, contra quebras democráticas.

Talvez não saibam que nós defendemos a liberdade de pensamento, o direito de a direita ser direita, o direito de existirem pessoas diferentes. Mas não podemos admitir que atentem contra a democracia, porque isso não foi tentado quando Bolsonaro ganhou a eleição. Os que não votaram nele admitiram o resultado eleitoral, e por isso, na democracia, quando se perde, se admite o resultado.

Talvez não saibam, mas precisam saber. Que a condenação que ocorrerá no Supremo é para que nunca mais quem perder a eleição tente um golpe, porque a democracia é o que nos garante o futuro.

FOTO: Ricardo Stuckert / PR

FONTE: https://www.brasil247.com/blog/um-drink-pela-democracia