O mundo inteiro sabe que o conflito na Venezuela não tem nada a ver com a disputa pela democracia no país.
Estudioso nenhum que acompanha minimamente as relações internacionais acredita na isenção da estratégia, reiteradamente repetida pelos Estados Unidos, de indiciar como narcotraficantes seus adversários políticos estrangeiros.
A bola da vez, já há algum tempo, é o presidente Nicolás Maduro, da Venezuela. No vizinho amazônico, o caso é grave, porque os Estados Unidos estão em águas caribenhas, nas cercanias do mar venezuelano, com sua frota naval ameaçando e atacando embarcações pesqueiras. As insinuações de apoio ao narcotráfico também tocaram o presidente colombiano Gustavo Petro, que muito corretamente se insurgiu contra o descabido assédio militar à América do Sul.
Não é de hoje que a Águia do Norte blefa com tal argumento. Em passado recente, também já foram rotulados de narcotraficantes: Evo Morales (Bolívia) e Hugo Chávez (Venezuela). Antes dos dois, Ernesto Samper (Colômbia) e Manuel Noriega (Panamá).
Dizer que é um acinte contra a soberania latino-americana é pouco. Trata-se de uma afronta desleal e escancarada. Uma miscelânea de leis dos Estados Unidos permitem ao país qualificar um mandatário de outra pátria de narcotraficante e, ato contínuo, estabelecer sanções justificadas na mentirosa responsabilidade dos acusados pela entrada ilegal de drogas no país.
Através da Foreign Narcotics Kingpin Designation Act (Kingpin Act) os EUA congelam bens e impedem transações comerciais com empresas e pessoas. Pela International Emergency Economic Powers Act, o presidente dos Estados Unidos pode declarar estado de emergência nacional e impor embargos ainda mais violentos. Com a Foreign Assistance Act e a Narcotics Control Trade Act, bem como com a Anti–Drug Abuse Acts, auxílio militar e financeiro podem ser suspensos e países podem ser listados em uma lista suja, sendo prejudicados em benefícios tarifários. Para completar, com a possibilidade dos Indictments Criminais Federais, a pedido do Departamento de Justiça dos EUA, um júri pode autorizar o governo estadunidense a processar, por suposto envolvimento com narcotráfico, corrupção e terrorismo, chefes de estado e autoridades estrangeiras.
Na Venezuela, a medida atinge diretamente Nicolás Maduro, o ex-vice Diodado Cabello, militares e altos funcionários do governo. Anos atrás, o procurador-geral do país, Tarek William Saab, recebeu sanções, e o ex-chanceler, Jorge Arreaza, foi solenemente ameaçado.
Atualmente, o Departamento de Estado dos Estados Unidos, por meio do programa Rewards for Justice estabeleceu
recompensa de US$ 50 milhões pela cabeça de Maduro. Ele é acusado de narcoterrorismo, tráfico de cocaína, conspiração com as FARC e lavagem de dinheiro. Pode haver algo mais ridículo?
O mundo inteiro sabe que o conflito na Venezuela não tem nada a ver com a disputa pela democracia no país – que isso não passa de “estelionato informativo” da grande mídia. Que os motivos reais são o petróleo, o ouro e as terras raras. A Venezuela tem a maior reserva comprovada de petróleo do mundo, maior que a Arábia Saudita, com mais de 300 bilhões de barris (apenas não adequadamente explorada devido às condições econômicas decorrentes das sanções). A Venezuela também é farta em ouro e terras raras em reservas sequer totalmente dimensionadas. Acrescente-se ao fato a posição estratégica do país na entrada do Caribe, às portas do canal panamenho, e na dianteira da América do Sul. É disso que se trata o conflito.
Dias atrás, Donald Trump afirmou que não invadirá a Venezuela, como fez George W. Bush (o pai), em relação ao Panamá, nos anos 80, mas o fato é que o porta-aviões USS Gerald R. Ford já entrou nas águas do comando sul-americano, tendo o país de Bolívar em sua mira.
Que bom que o presidente russo Vladimir Putin já afirmou que não aceitará ataques à Venezuela, inclusive já havendo estabelecido parceria estratégica de reforço em cooperação militar, segurança e defesa, o mesmo que também o fez o estadista chinês, Xi Jinping.
A propósito, é sempre bom lembrar que noutra oportunidade (não atinente especificamente à Venezuela, contudo em forte crítica a elevação de tensão com os Estados Unidos) o ex-ministro da defesa chinês, Wei Fenghe, declarou que a China não daria o primeiro tiro, mas não hesitaria em dar o segundo se fosse necessário.
Ditos e não ditos à parte, a torcida maior é para que os homens de poder tenham juízo e não comecem mais um novo confronto bélico sem justo motivo. Até mesmo porque a população venezuelana não é igual à estadunidense. Ela está totalmente mobilizada, sabe bem por que está e não abrirá mão da defesa da soberania de seu país. Se hesitasse quanto a isso, já teria entregado os pontos há muitos anos.
Foto: Telesur
FONTE: https://www.brasil247.com/blog/venezuela-a-falacia-do-narcotrafico